Diretamente da secção Un Certain Regard do Festival de Cannes, onde saiu premiado, para as salas de cinema nacionais, “How to Have Sex” pode soar ao título de um manual para a promiscuidade, mas a sua energia, sobriedade e carga dramática, bem articulada a partir da construção de personagens com alguma densidade, por parte da realizadora e argumentista Molly Manning Walker, eleva-o a um método de observação naturalista de um ritual de passagem.

Sempre a “bombar” temas eletrónicos (da autoria do produtor e DJ Jacob James, também conhecido como Jakwo) que evocam o ambiente de inebria de adolescentes e jovens adultos britânicos numa localidade grega junto ao mar, onde celebram as suas pausas educativas, esta primeira incursão da cineasta britânica nas longas-metragens deixa-se levar pelos lugares-comuns para abordar questões como as expectativas, a pressão social, a manipulação e o consentimento, tudo a partir de adolescentes que nunca largam o álcool, a música e a festa como escape a decisões difíceis de tomar para o resto das suas vidas.

No caso de Tara (interpretada pela impressionante Mia McKenna-Bruce), além de estar no seu pano de fundo a pressão da nota de um exame que vai ditar o futuro imediato, existe a sua virgindade, assumida como uma “condição” inexplicável pelas amigas que a acompanham nas férias, Skye (Lara Peake) e Em (Enva Lewis). Por isso mesmo, Tara tem na sua mente a ideia de perder a virgindade nesta pausa do mundo real, mas o seu objetivo vai ter um desenlace bem longe de qualquer pragmatismo ou romantismo.

Sempre bem acompanhada e em sintonia pela direção de fotografia de Nicolas Canniccioni, que captura noite e dia com altos contrastes de saturação de cor, refletindo uma juventude em transe, e pela potência controlada de Fin Oates na montagem, Molly Manning Walker perde bastante tempo a construir e expor as suas personagens por entre bebedeiras e ressacas, conversas sobre tudo e sobre nada, como que estudando relações, connosco e com os outros, sem se reduzir aos princípios da maldade atribuída a um género ou extrato social. Ao invés, ela observa a conduta humana mediante as leis de herança social, a influência do meio que as rodeia e do tempo que vivem, usando o experimentalismo como carburante de transformação e passagem ao nível seguinte das fases da vida, isto é, da adolescência à idade adulta.

Nisto tudo, impressiona e percebe-se o “certo olhar” que Cannes dedicou à maturidade da cineasta e argumentista no meio de dúvidas, condicionalismos, opressões e violências, visíveis e invisíveis, em particular nas raparigas desta idade. Vale a pena ver “How to Have Sex”.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
how-to-have-sex-observacao-naturalista-de-um-ritual-de-passagemImpressiona e percebe-se o “certo olhar” que Cannes dedicou à maturidade da cineasta e argumentista no meio de dúvidas, condicionalismos, opressões e violências, visíveis e invisíveis, em particular nas raparigas desta idade