Com o tema da descolonização da mente a produzir múltiplas abordagens documentais, “The Phantom of Sierra Madre” surge como uma adição com valor, ainda que no final, talvez inadvertidamente, possamos dizer que se cria, ou se assume, uma nova figura, o do “white savior” consciencializado. Mas vamos por partes.

Há oito anos, o argumentista dinamarquês Lars K. Andersen teve a ideia de embarcar na jornada de fazer um filme inspirado no seu herói de infância, o explorador norueguês Helge Ingstad, de quem guarda um livro que ele firma mudou a sua vida.  Na tradição milenar dos exploradores, figuras imortalizadas na História, Ingstad partiu em 1937 para uma expedição ao México em busca de reminiscências da tribo Apache norte-americana, derrotada em 1886, e circunscrita a uma reserva depois disso.

Mas aquilo que começa com um realizador e argumentista a serem eles mesmo exploradores em busca de descendentes Apaches perdidos, algures nas montanhas mexicanas, transforma-se numa desconstrução da mitologia do aventureiro branco, principalmente quando se começa a descobrir que a história sobre a expedição que Helge Ingstad escreveu foi profundamente romantizada a seu favor e do entretenimento global. E, ao fazer isso, acompanhados por Pius, bisneto do guerreiro Apache Geronimo, que acredita firmemente na presença dos Apaches no México, o realizador Håvard Bustnes e o argumentista desconstroem igualmente o papel do cinema, fletindo para temas como a apropriação e novas formas de colonização através do poder de quem conta as histórias que não são sua.

Da aventura documental, ao estilo de “Á procura de Sugar Man”, passamos então para discussões woke (de consciência das questões relativas à justiça social e racial) que filmes como o recente vencedor do Festival de Berlim, “Dahomey”, abordam com precisão clínica, sem nunca se esquecer a dimensão fílmica, pois a certo ponto, “The Phantom of Sierra Madre” discute nele mesmo a razão da sua existência e a forma como proceder após algumas revelações bombásticas. 

Claro está que esta desconstrução – da colonização, da mitologia dos exploradores e dos cineastas que embarcam nestas aventuras em busca de algo ou alguém – é sempre saudável nos tempos atuais, pois este é um debate em movimento. Porém, no final, quando se diz que se descobre que o filme não era sobre o argumentista e o seu fascínio por Helge Ingstad, mas sobre os visados (Apaches), as alegações de humildade intelectual soam a uma forma ensaiada de elevação dos próprios, como se existisse uma “moral high ground” no lidar com todas estas questões woke.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
the-phantom-of-sierra-madre-na-procura-por-apaches-encontra-se-a-conscienciaEsta desconstrução - da colonização, da mitologia dos exploradores e dos cineastas que embarcam nestas aventuras em busca de algo ou alguém - é sempre saudável nos tempos atuais