Se ¡Vivan las antípodas! era – ao seu jeito – uma celebração da vida em pontos distantes do globo, a partir da concretização de “Aquarela” (2018) , Victor Kossakovsky começou a relatar a guerra em marcha dos homens com a natureza, conflitos que estamos destinados a perder. O cineasta russo, que “fez escola” com Alexandre Sokurov, há uma década atrás afirmava que o cinema documental deveria evitar a mensagem (panfletária), mas ao longo dos seus últimos três filmes têm seguido totalmente em sentido contrário, sublinhando frequentemente a insustentável maneira de viver do ser humano contemporâneo.

Seguindo a água nos seus variados estados (sólido, gasoso, líquido), “Aquarela” levava-nos diretamente à urgência climática que estamos a viver. “Gunda”, que se seguiu em 2020, prosseguiu essa linhagem através da história de um grupo de animais numa quinta, levantando a questão de como a indústria agroalimentar é uma das grandes responsáveis pela degradação do planeta. Anos passam e o realizador volta a carregar na mesma tecla, mas desta vez têm como alvo a arquitetura e a escolha dos materiais de construção, com o cimento e a consequente extração de matérias primas para o criar, a representarem também eles formas insustentáveis de viver que a humanidade recusa abandonar.

Munindo-se de imagens estonteantes do planeta Terra, de Beirute à Ucrânia (fica explícita a opinião do cineasta sobre o tema), Kossakovsky critica mais uma vez a degradação ambiental, desta feita pela forma temporária como tudo é construído, em particular edifícios que se espera que durem 50 ou 60 anos, em oposição aos grandes trabalhos dos mestres do passado, que construíram edificado que se aguenta há milénios. E para fazer isso, o russo centra-se num projeto paisagístico do arquiteto italiano Michele De Lucchi, que se espera ficar para a posteridade. Kossakovsky usa o círculo criado por este para refletir sobre a ascensão e a queda das civilizações, enquanto faz – de forma profundamente imagética – um novo alerta. 

É um trabalho de beleza impressionante que mais uma vez deve fazer um pequeno circuito nos cinemas, mas deverá invadir a agenda dos planos escolares.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
architecton-a-insustentavel-maneira-de-viver-do-ser-humanoO cineasta russo, afirmava, há uma década que o cinema documental deveria evitar a mensagem (panfletária), mas ao longo dos seus últimos três filmes têm seguido totalmente em sentido contrário, sublinhando frequentemente a insustentável maneira de viver do ser humano contemporâneo.