Depois de construir uma carreira de atriz, a canadiana Monia Chokri lançou-se na realização em 2019 com “La femme de mon frère”, uma fábula carregada de nostalgia onde os termos “idade adulta” e “maturidade” surgiam dissociados num autocrítico e tardio (anti) coming-of-age sem cedências em torno de uma trintona que não sabe bem o que fazer depois do doutoramento. Seguiu-se “Babysitter” (2021), onde após uma piada machista se tornar viral, um homem perde o emprego e embarca em uma jornada terapêutica para se libertar do sexismo e da misoginia.

Agora, em 2023, Chokri regressa mais uma vez com uma comédia tão doce como afiada, mas da trintona do seu primeiro filme passamos para a quarentona Sophia (Magalie Lépine-Blondeau), uma professora de filosofia, sempre metida em conversas intelectuais, que tem um aparente casamento feliz com o também inteletual Xavier (Francis-William Rhéaume). Nas suas aulas, ela frequentemente fala de amor e cita filósofos que se debruçaram sobre o tema, mas nenhum deles parece a ter preparado para Sylvain (Pierre-Yves Cardinal), um empreiteiro que contrata para fazer obras na sua nova cabana no lago. A tesão e a paixão entre os dois é imediata, mas será que estes dois mundos diferentes são compatíveis?

A base para qualquer comédia romântica, ainda que exista ironia e sentido crítico nelas, é a química entre os protagonistas, coisa que desde o primeiro momento se sente quando a dupla se conhece na avaliação do custo das obras na cabana. Zooms e outros movimentos de câmara exagerados, aliados a uma direção de fotografia interessada em enquadrar o casal no momento exato do “love is happening”, enquanto músicas melosas surgem em pano de fundo (como as de Michel Sardou), são artimanhas aplicadas para situar a posição de Chokri numa fase da carreira que diria tem o seu quê de Agnes Jaoui. Mas a verdade, e olhando já para o passado da cineasta canadiana, a construção do seu estilo, que muitos associam ao “cinema hipster contemporâneo”, vem bem de trás, ainda antes de se estrear na realização e trabalhar como atriz, em filmes como “Emma Peeters” de Nicola Palo e “Amores Imaginários” de Xavier Dolan.

No final, esta comédia romântica made in Quebec mostra o verdadeiro pegar nos clichés, desconstruí-los e reformulá-los à luz maior da contemporaneidade, mesmo que por aqui o célebre e antiquado “o amor e uma cabana” impere como toda a glória.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
simple-comme-sylvain-o-amor-e-uma-cabanaEsta comédia romântica made in Quebec mostra o verdadeiro pegar nos clichés, desconstruí-los e reformulá-los à luz maior da contemporaneidade