Depois de um interessante, muitas vezes espectacular, mas muito pouco surpreendente primeiro filme da nova geração da franquia em 2014,  Godzilla regressou às salas em 2019 (Godzilla: Rei dos Monstros) com o mesmo vigor e lustro visual, mas extremamente enfraquecido e atabalhoado nas interações humanas, com uma tendência para os sentimentos básicos, onde não faltava um patético sacrifício e relações maternas, paternas e fraternas a roçarem a lamechice primária.

Esta revisita tremenda ao pior que o cinema catástrofe dos anos 90 tinha em si (que nalguns casos era tão mau que se tornou bom), acentua-se ainda mais em “Godzilla vs. Kong” (2021), que além de todos os mesmos problemas nas personagens humanas e nas suas relações do filme anterior, apresenta uma ausência quase total de humor, tendo em si uma seriedade e sobriedade que juntamente com a sua narrativa absurda só o transforma no pior e mais patético dos 3 últimos filmes da saga Godzilla

É quase inenarrável a falta de nexo global e sensação de vazio neste série B de luxo que continua a ter como único chamariz as artimanhas visualmente espampanantes entre as criaturas, com estas a destruírem barcos, aviões e cidades inteiras, sem que um morto sequer se veja em cena. E tudo começa aqui quando Godzilla, inexplicavelmente (claro que há uma razão) mostra-se decidido em atacar instalações de pesquisa administradas pela Apex Corporation. No outro lado do ringue, está Kong, que encontra-se sob contenção na Ilha da Caveira. Às duas por três os dois monstros estão em rota de colisão e no meio estão os humanos, aqui comandados por teorias idiotas de dois cientistas bem intencionados (Rebecca Hall e Alexander Skarsgärd sem química).

Não vou entrar por aqui na conversa do cinema vs feiras vs parques de diversão, que Scorsese já esgotou nas suas palavras, mas mais que um filme temos um exercício audiovisual circense, que naturalmente – e depois de 2 filmes – vai soar a já visto e redundante. Claro que para muitos, todas estas lutas são ultra “fun”, como os americanos dizem, mas tudo isto é muito mais próximo do videojogo, de um combate ensaiado de wrestling, cuja a arena é o mundo, sempre cheio de fogo de artifício (explosões), que só desligando o cérebro se torna suportável.

E se na vertente criaturas temos o que se esperava – exuberância visual – na vertente humana temos imbecilidade atrás de imbecilidade, más opções atrás de más opções, aliás, como quase sempre nestes filmes-catástrofe. Rebecca Hall e Alexander Skarsgärd são tão credíveis nos seus papéis como os porta-vozes da Ciência Pela Verdade, cabendo sim a uma jovem atriz muda,  e à sua interação com Kong, a capacidade de ligar o espectador emocionalmente ao que assiste e criar alguma forma de empatia.

E sim, Millie Bobby Brown também anda por lá- em ações paralelas – com mais duas personagens, mas também ela e os seus comparsas parecem perdidos na relevância até ao derradeiro momento, onde serão fulcrais para desvendar o verdadeiro vilão disto tudo que só se estranha não ser russo.

No final, destaque ainda negativo para Adam Wingard, que opera o filme de forma genérica e sem qualquer ponta de individualidade ou criatividade, apenas entregando o produto de estúdio focado na ação desmiolada e sentimentos básicos.

Se no cinema existissem tabelas nutritivas, “Godzilla vs. Kong” era o equivalente a 10 mil calorias vazias.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
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