Os temas da maternidade têm estado sempre em destaque no cinema, mas pegando apenas em exemplos contemporâneos, ainda no ano passado filmes como o argentino “Maternal”, o sueco “Charter” e especialmente o nipónico “As Verdadeiras Mães” apresentaram novos registos e olhares refinados sobre o tema. Pegando neste último, que tem pontos extremamente em comum com este “Aurora”, é curioso refletir que onde a cineasta japonesa Naomi Kawase resolve a sua história a favor do melodrama, a costa-riquenha Paz Fábrega responde com um olhar pragmático  sofisticado, sem nunca perder uma transformação que se sente orgânica nas suas personagens e história.

E são dois os focos da cineasta, neste seu filme com estreia mundial no Festival de Roterdão: de um lado temos Luisa (Rebeca Woodbridge), uma arquiteta nos seus 40 anos que dá aulas de arte numa espécie de ATL; e do outro temos Yuli (Raquel Villalobos), a irmã adolescente de um dos seus alunos que descobre que está grávida de cinco meses. É num encontro fortuito numa casa de banho, em que Yuli vomitava, que a vida destas duas mulheres vai-se cruzar, iniciando-se uma jornada e um plano para ultrapassar a gravidez da jovem.

Nesse sentido, Paz Fábrega foge dos lugares-comuns e de terrenos pantanosos minados de possíveis clichés para, através da contenção e um raro sentido de normalidade, um “a vida continua” sem nunca perder o carinho que nutre pelos seus objetos, para mostrar uma história onde não faltam pressões sociais.

Fascina igualmente o tratamento – diríamos mesmo, o olhar refrescante – da juventude retratada, que não se coíbe de transformar os supostos momentos de estudo em orgias planeadas, e que resultaram nesta gravidez indesejada, mas não surpreendente. Sem qualquer olhar moralista condenatório, mas também sem uma validação autoral, Fábrega limita-se apenas a centrar a sua atenção nas amizades (coloridas) construídas e num sentido de responsabilidade que revela uma maior maturidade do que à partida se podia pensar. E “Aurora” é isso mesmo. Um filme maduro, íntimo, que mostra uma questão que faz parte de um problema social, com ramificações políticas, até porque invade o terreno da legislação sobre adoções, mas que nunca deixa de ser um objeto cinemático sobre pessoas, as suas relações familiares e de amizade, onde a solidão joga igualmente um papel importante, pois fomenta dependências artificiais.

Uma bela surpresa repleta de ternura e cérebro, longe de qualquer manipulação emocional ou militante.