“Maputo Nakuzandza”, o documentário realizado pela realizadora brasileira Ariadine Zampaulo conta a história de um dia numa cidade: a Maputo de Chamanculo, um bairro histórico, mas também de Xipaminene e dos seus mercados, uma tapeçaria urbana simultaneamente documento histórico de uma cidade no tempo, mas que também resulta um pequeno poema sinfónico. E esse lado poético do documentário tem como mote organizador uma emissão de rádio, uma presença constante no quotidiano que de certo modo vai revelando as diferentes facetas no espaço urbano na mesma medida em que fixa um imaginário comum.

Para Zampaulo, Maputo nunca deixa de ser um espaço aberto ao insólito, e é também essa sensibilidade que puxa o filme para o campo da ficção, um cruzamento entre a realidade contemporânea da cidade que procura documentar, e um retrato dramatizado da vida das pessoas que nela habitam. A dada altura e logo pela manhã, a rádio dá a notícia do súbito desaparecimento de uma noiva, um desaparecimento que deixa noivo e convidados pendurados na igreja (a teoria corrente é de que se trata de um rapto…), e logo de seguida Zampaulo e a sua câmara de filmar encontram a noiva desorientada no meio da cidade, deambulando como que perdida na confusão do começo do dia. E é deste contraponto polifónico com liberdade dramática,  entre o que a rádio conta e o que o cinema mostra, que a montagem de Zampaulo vai dando forma ao documentário.

Ainda assim, é nos momentos em que o filme mais se solta deste impulso “ilustrativo” (que se sente forçado, como se as histórias da cidade tivessem que ser inventadas para lhe dar cor) que mais depressa se sente o pulso contemporâneo da cidade. Numa rubrica da emissão dedicada à poesia Moçambicana ouve-se um poema de Hirondia Joshua, uma das vozes da nova geração de poetas moçambicanos que assenta como uma luva no ziguezague urbano que “Maputo Nakuzandza” vai desenhando, um percurso que acompanha um atleta que corre pela cidade de ponta a ponta, sempre com a energia da “visão atómica da coisa branca” de que fala Joshua a invadir o espaço cinematográfico. É o coração de um documentário que por vezes se dilui em apontamentos laterais de interesse relativo, mas que ainda assim e apesar de tudo nunca deixam de comentar as dinâmicas sociais que dão vida ao quotidiano de Maputo.

Pontuação Geral
José Raposo
maputo-nakuzandza-cidade-atomica "Maputo Nakuzandza", o documentário realizado pela realizadora brasileira Ariadine Zampaulo conta a história de um dia numa cidade: a Maputo de Chamanculo, um bairro histórico, mas também de Xipaminene e dos seus mercados, uma tapeçaria urbana simultaneamente documento histórico de uma cidade no tempo,...