Todas as lágrimas reservadas para as sessões do Festival de Cannes e de Antália foram gastas com “Close”, uma delicada segunda obra do belga Lukas Dhont que, depois de “Girl”, sobre  uma jovem de 15 anos, nascida no corpo de um homem, que sonha em se tornar bailarina, regressou com um doloroso coming-of-age marcado pelos sentimentos de perda e culpa.

No centro do enredo está uma grande amizade entre dois rapazes de 13 anos, Gustav De Waele e Eden Dambrine como Rémi e Lé, cujo união é abalada quando entram na escola e uma tragédia sucede.

Inseparáveis, os dois, vagueiam pelos campos floridos por entre brincadeiras, intimidades e carinhos. A intensidade da amizade é tal que, na escola, chegam a perguntar se são um casal, levando Leo a afastar-se progressivamente do amigo de forma a escapar a possível bullying e à curiosidade alheia que o começa a perturbar. Desse afastamento resulta uma cisão que irá conduzir à tragédia, aqui tratada por Dhont com uma candura ímpar que transforma todo o processo em algo tão orgânico como doloroso.

Segue-se depois uma série de sensações e ações humanas normalmente associadas à perda, onde não falta a negação, a assunção de culpa e a aceitação de responsabilidades, todas sensações que são transportadas de Leo para os adultos em cena, onde se destaca a sua mãe, interpretada com toda a sensibilidade e destreza por Léa Drucker, mas também por Émilie Dequenne, como a mãe de Rémi, que carrega o fardo da incompreensão de tudo o que aconteceu.

Uma viagem do belo ao horrível, da idade infantil à adolescência e à chegada de problemas bem adultos, que rompem com a ingenuidade característica da infância, “Close” é um filme de ruturas que num nível bem diferente do que Laura Wendel apresentou no seu “Playground” mostra novamente o recreio escolar, esse espaço social longe de qualquer bolha protetora, como elemento de distúrbio e de cessações na passagem entre estágios da vida.

Dhont não evita no final alguns elementos visuais e sonoros facilmente caracterizáveis de manipulação emocional, especialmente quando coloca novas correrias pelos campos floridos em contraste com as imagens iniciais do filme, mas isso são apenas detalhes pois já muito antes disso tinha nos tinha arrebatado com o “Ciclo Interrompido” de uma amizade que parecia inabalável perante qualquer um.

Fazes me falta“, diz Leo a certo ponto. E nós acrescentamos: fazem falta mais projetos assim com tanta intensidade e coração.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
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