Soou a um caso mal amparado quando se soube que Ira Sachs, realizador nascido e criado em Memphis e um terno habitante e devorador da cultura nova-iorquina, iria filmar na zona de Sintra a sua sétima longa-metragem com um elenco internacional, encabeçado por Isabelle Huppert.

Automaticamente, a ideia de um cartão de visita ao tão cinematográfico concelho surgia nas nossas memórias, porém, e não querendo fugir do típico percurso postal, Frankie é um filme duplamente intimo vindo de um cineasta independente cada vez mais respeitado nos mais diversos nichos. E o primeiro foco de intimismo localiza-se em Sintra como um canto de recordações e emoções há muito não vividas (Sachs confidenciou-nos essa ligação). Poderia ser qualquer lugar, mas não, o realizador encontrou o seu retiro espiritual e o contacto direto com a saudade, funcionando numa espécie de revisitação daqueles lugares alicerçados numa aura proustiana.

Em relação ao segundo, a intimidade para com as personagens, todas estrangeiras e deslocadas do seu habitat natural para serem posicionadas num satírico xadrez de relações, afetos e afinidades. Contudo, é a distância com que o espectador as encara que confirma o gesto de proteção por parte de um realizador tão delicado com a sensibilidade das personagens do seu universo (olhe-se para as suas obras anteriores, como Love is Strange – O Amor é uma Coisa Estranha ou Homenzinhos).

Assim, é neste nosso olhar de longe que deparamos que todas estas figuras são incapazes de emancipar-se do respetivo ator, sem nunca ceder aos tons biográficos de cada um, mas sim à imagem vendida e comercializada no circuito cinematográfico. Esse carinho para os protagonistas do legado e devoção de Ira Sachs à sua micro-indústria e ao seu cinema mais próximo é quase como se fosse um método preservação em etanol.

Em certo jeito, Frankie é uma obra pessoal estampada como uma peregrinação a uma adolescência perdida e, ao mesmo tempo, uma aventura do cineasta em assumir o espírito europeu, as romarias rohmerianas, um risco em replicar uma utopia estilística e provar uma certa versatilidade.

O resultado pode ser uma derivação desses atos cinematográficos, o simplismo como forma e a invocação de um naturalismo estagnado e perversamente calculado, assim como aquela bela sequência final, uma das mais fortes vistas este ano: uma dança de abraços vivo com a morte perante a omnipresente beleza natural, a única certeza para o conceito de eternidade.

Ira Sachs fala aqui de despedidas, redescobertas, carícias prometidas e ainda arranja espaço para troçar da indústria que evita integrar, usando como refém o estandarte do capitalismo cinematográfico [Star Wars], tudo num filme pleno, seguro e sobretudo económico com os gestos. E tudo isto, em Sintra!