A juta, também conhecida por serapilheira em Portugal, foi uma das indústrias mais lucrativas e importantes da Índia nos últimos 100 anos. Milhões de pessoa por toda a nação, trabalhavam, em diferentes fases de produção, a partir dessa erva lenhosa, transformada em fibra têxtil vegetal, começando-se a sentir progressivamente dificuldades no mercado com a introdução de fibras sintéticas associadas à cada vez maior utilização de plástico, como o nylon e o terylene (feito a partir do polyester).

No apogeu dessa indústria, milhões de pessoas em Bengala ganhavam a vida com ela, com meios de produção que pouco ou nada mudaram desde a revolução industrial. A maquinaria e as fábricas, com um século de história, foram reparadas incessantemente, mas os novos desafios capitalistas colocaram-na em risco de decadência. Se juntarmos a isto uma maior atenção para as questões laborais, ou seja, um olhar sobre quem a trabalha, esta indústria começou a vacilar, mesmo que o alegado olhar pela sustentabilidade do planeta  trouxesse uma nova atenção a este concorrente natural do sintético. 

É partir desse declínio, destas transformações e novas necessidades ecológicas, que a documentarista Nishtha Jain (“Gulabi Gang“) traz até ao espectador os últimos vestígios desta indústria, acompanhando, através de imagens criteriosamente compostas – capazes de transformar o suor e sofrimento de quem labora em toda a cadeia de produção, desde o corte e secagem da cana até a tecelagem, em elementos de rara beleza cinemática. Mas essa beleza sofrida, equiparável à que vemos no famoso concurso internacional World Press Photo, tem a arte de nunca alienar o espectador para longe das questões essenciais e do poder de reflexão, quer seja na orientação para questões “verdes”, quer seja para temas laborais. E essas imagens de rara beleza são acompanhadas por depoimentos sofridos dos trabalhadores, diversas reivindicações sindicais, ajustamentos capitalistas do patronato, e a ausência de apoios estatais à sustentabilidade, traçando um retrato exaustivo de ascensão e queda de uma indústria, mas também de um modo de ser e de trabalhar.

Com esta riqueza estética, da imagem e som substituírem qualquer necessidade expositiva, torna-se totalmente desnecessária qualquer voz-off descritiva do que as imagens já mostram com rigor. Nishtha Jain tira-a sabiamente da equação e apenas no início e fim do seu filme contextualiza centenas de anos de história e ambições para o futuro relativamente à juta em pequenas doses de palavras em jeito de introdução e conclusão.

Além disso, “The Golden Thread” é um documentário que não se fecha em si, isto é, no negócio da juta, mas serve de modelo para mostrar outras centenas ou milhares de indústrias que se foram tornando obsoletas com o passar dos tempos, mas que ganham agora uma atenção e esperança para um futuro mais sustentável do planeta.

The Golden Thread”, que ganhou o  Grande Prémio Ambiente do CineEco 2023, é assim um objeto de grande interesse, não tanto comercial na arte de encher de salas de cinema, mas acima de tudo no circuito educacional. A não perder.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
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