Poderia ser um filme declarado de horror e, pensando bem, até o é, tal o cerco que a personagem interpretada por Simona Peková, Valerie, faz ao filho e à nora. Porém, no esqueleto deste “She Cames at Night” está, acima de tudo, uma comédia dramática de contornos negros. 

O She (ela) do título assume uma forma de assombração e o medo é real. Aneta (Annette Nesvadbová) e Jirka (Jiří Rendl) são um jovem casal apaixonado: ela terapeuta num hospital, ele tradutor freelance. Os dois veem a sua felicidade ser invadida por Valerie (Simona Peková), a mãe de Jirka, a qual, habitualmente, depois das suas relações amorosas colapsaram, “pede” ajuda ao filho para lhe dar guarida. É o caso típico de um pedido de ajuda que de um dia passa a uma semana, e logo depois a um mês. Mas o problema de Valerie não é a intrusão em si, nem o tempo que ela ocupa, mas a forma como ela se intromete em absolutamente todos os espaços, momentos e conversas do casal. Sempre num modo entre a diva, a rainha do drama e antiga rockstar debochada, Valerie transforma a vida do filho e da companheira no mais profundo caos, pondo assim a relação destes em perigo, sem se importar absolutamente nada com isso. A invasão da privacidade do casal é algo natural para ela, que se vê, a todo o momento, como o “centro do universo”.

Filmado em apenas 17 dias e vencedor de boa parte dos prémios do cinema checo em 2023, She came at night tem várias mudanças de tom, fugindo do território estereotipado da comédia de horror (esta “mãe do inferno” torna-se uma verdadeira stalker), mantendo a “perseguição” como algo bem real e terreno.

Esta complexa mistura de drama, comédia e até thriller é carimbada por uma atmosfera pesada, mas mascarada de ligeireza, algo que acaba sempre por deixar o espectador no campo da incerteza, especialmente quando Valerie leva um novo “amigo” para o apartamento, bebem uns copos e passam de um perigo passivo para ativo, obrigando o casal a abandonar a sua própria casa.

Claro está que, num filme desta índole, a prestação dos atores é fundamental e Peková brilha com a sua persona intrusiva. Mas é principalmente quando ela não está no ecrã, mas sempre na nossa cabeça, que nos persegue também a nós, tornando o medo como algo partilhado entre o espectador e o grande ecrã. E só esse facto – de estimular em nós o tom de pesadelo permanente – é uma verdadeira conquista para os realizadores Jan Vejnar e Tomáš Pavlíček.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
she-came-at-night-uma-sogra-do-piorPeková brilha com a sua persona intrusiva. Mas é principalmente quando ela não está no ecrã, mas sempre na nossa cabeça, que nos persegue também a nós, tornando o medo como algo partilhado entre o espectador e o grande ecrã.