Voltando à temática do luto, que já abordara em “L’Attesa“, mas dando agora uma ambiência futurista e distópica, o italiano Piero Messina regressa ao cinema com “Another End”, um drama que tinha tudo para se revelar de excelência existencial, mas que assumidamente foge de qualquer verdadeira reflexão e meditação política, social ou até romântica, para se assentar na dor e na perda como valor individual digno de manipular.

E se em “L’Attesa” era Juliette Binoche a segurar as pontas do descalabro emocional que o luto provoca, aqui é Gael Garcia Bernal a fazê-lo, um homem que juntamente com a mulher sofre um acidente de viação. Carregado de culpa pelo acidente e pela morte da esposa, entra em depressão, pensa no suicídio e, vezes sem conta, para além do permitido, revê as memórias da mulher  recorrendo à tecnologia existente. A verdade é que neste futuro, nesta metrópole sem nome (as cenas de exteriores foram feitas em Neuilly), existe uma empresa que permite – temporariamente – transferir as memórias do que chamam de “ausentes” (mortos) para hospedeiros viáveis, permitindo assim que os entes queridos dos falecidos possam ter tempo para se despedirem dos que “partiram”. Com uma das trabalhadoras dessa empresa – Ebe (Berenice Bejo), irmã de Sal – as portas estão abertas para a experiência e corrupção moral.

Sob a capa do amor e do romance, tudo parece permitido por aqui e os dilemas sobre o ler as memórias dos outros, sem permissão para isso, são apenas tratados como problemas corporativos, despachados com facilidade, mas nunca morais ou éticos. Focando-se apenas na atitude de Sal, que a certo ponto se recusa a terminar a experiência de se envolver com o novo corpo (Renate Reinsve) para onde foram transplantadas as memórias da esposa, o filme cai na manipulação primária do amor.  Ora, aqui, amor vence tudo, é tudo e vale fazer tudo por ele. Só que não.

Sem suficiente autocrítica para com o seu protagonista ou o mundo em que se insere, nem expandindo ou instigando a discussão sobre o tema da memória, resta então um filme onde tudo é romanceado seguindo lugares comuns emocionais, o que se adicionados a uma direção artística derivativa, situando o espectador num mundo pós-“Blade Runner” esterilizado, transformam o filme num objeto apenas de entretenimento, onde apenas a “table dance” que Gael Garcia Bernal pede a certo momento oferece uma multidimensionalidade emocionail.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
another-end-antes-do-adeusSob a capa do amor e do romance, tudo parece permitido por aqui e os dilemas sobre o ler as memórias dos outros, sem permissão para isso, são apenas tratados como problemas corporativos, despachados com facilidade, mas nunca morais ou éticos.