O que é a Liberdade? Esta é uma daquelas questões que foi pensada e discutida durante milhares de anos, pelo menos do que nos é possível perceber do que nos chegou escrito, mas podemos pensar que terá uma longa história ainda antes disso. Veja-se o super ambicioso “O Princípio de Tudo” de David Graeber e David Wengrow, onde a história deste conceito é explorada, para lá do que foi escrito, no registo arqueológico. Com todo este manancial, é estranho que a existência desta ideia, apesar de parecer fundamental no Ocidente, seja tão mal investigada na cultura popular, ficando-se por algo amorfo e sem força, mais usado para justificações neoliberais de transgressões individuais (leia-se, ser um sacana para os outros) ou para vender t-shirts do Che.

Yaya e Lennie” é mais um desses produtos culturais que, baseado num conceito limitado de Liberdade, acaba por se colocar numa posição dificilmente defensável, se pensada mais do que alguns segundos. Conta a história de dois amigos, educados pela mesma pessoa, a quem chama “Tia”, num cenário pós-apocalíptico em que a selva parece ter invadido as cidades e em que uma sombria “Instituição” rouba crianças para fins potencialmente nefastos, apesar de nunca mostrados. Ao serem descobertos pela dita instituição, são obrigados a fugir e, no caminho, vão encontrando várias pessoas e situações.

Há qualquer coisa de perturbador nesta animação, como que uma falta de convicção na sua qualidade, que se traduz numa série de opções estéticas com resultados insatisfatórios: desde o filtro das luzes, como um padrão que se sobrepõe continuamente à imagem para lhe dar o aspeto de tela e que acaba por lembrar a pixelização da falta de resolução dos filmes num mau serviço de streaming. Mas o pior é mesmo a incapacidade de definir essa ideia de liberdade que parece alinhar-se com uma posição new-age anti-científica, sem nunca conseguir definir o porquê da necessidade de resistir à “instituição”. No final, acaba por parecer um conto escrito por um adolescente angustiado, sem grande profundidade e sem ideias. E eu sei, porque o fui e porque os escrevi, mas tenho noção suficiente para nunca os ter publicado, quanto mais ter feito filmes com eles.

Se há algo positivo neste filme são os créditos finais, e não na piada óbvia de ser o fim do filme (o que também é verdade), mas porque mostram que este podia ter sido muito mais interessante com uma animação desenhada (ao contrário do 3D do resto do filme) com mais qualidade e cores mais vibrantes

Pontuação Geral
João Miranda
yaya-e-lennie-liberdade-em-andamento-mas-para-onde-vai“Yaya e Lennie” é mais um desses produtos culturais que, baseado num conceito limitado de Liberdade, acaba por se colocar numa posição dificilmente defensável, se pensada mais do que alguns segundos