Disponível na Netflix, “tick, tick…BOOM!” é a adaptação cinematográfica do musical homónimo e autobiográfico de Jonathan Larson, o autor da obra disruptiva “Rent”, um dos mais importantes musicais dos anos 90.

Num papel sensível e obcecado, Andrew Garfield (The Amazing Spider-Man, Hacksaw Ridge) interpreta Jonathan, o talentoso compositor que procura estabelecer-se na Broadway enquanto trabalha como empregado de mesa no Moondance Diner. Todo o tempo que tem, ele dedica-o a “Superbia”, uma distopia satírica semelhante a “1984” de George Orwell, e que segundo Larson, será “o primeiro musical para a geração MTV”.

Já se passaram oito anos desde que começou a escrever e finalmente a grande oportunidade aproxima-se. Mas a criatividade escasseia, o tempo faz falta e Jonathan vê-se confrontado com a possibilidade de rejeição e de não ser bem-sucedido antes dos 30 anos de idade. Como assim conseguiu o seu ídolo Stephen Sondheim (letrista de West Side Story, compositor de Sweeney Todd).

Escrito por Steven Levenson, com músicas do próprio Larson e realizado por Lin-Manuel Miranda, que aqui se estreia na realização, “tick, tick…BOOM!” é um tributo à Broadway e aos seus artistas, à cena boémia de Nova Iorque e à criatividade visionária do malogrado Larson, ele que morreu em 1996 de um aneurisma cerebral, na noite anterior à grande premiere de Rent.

Lin-Manuel Miranda, ator, compositor, dramaturgo, autor do fenómeno Hamilton, criador das músicas de Moana, vencedor de Grammys, Tonys e Pulitzers, que vai estabelecendo o seu estatuto de inovador dentro do género musical, foi a melhor escolha para assumir a direcção desta mescla de sensibilidades.

Não pelo seu estilo de realização, onde apesar dos bonitos floreados e da exuberância teatral de peito cheio, chega a revelar alguma imaturidade… mas sim pela forma humilde e apaixonada como aborda a obra e vida do compositor. Miranda venera Larson como Larson venerou Stephen Sondheim. É difícil não encarar “tick, tick…BOOM!” como uma passagem de testemunho.

Com a ajuda do seu dom verboso e eloquência, faz-nos seguir interlúdios musicais que balançam a integridade e a segurança, a alma artística e a venda comercial, espelhando o processo criativo, os conflitos entre medo e amor, desafio e fuga, fracasso e encorajamento.

Mas que não chegam para equilibrar a dramaturgia do filme nem responder às perguntas que Jonathan tanto anseia ver respondidas, pois os amigos que o envolvem vão sendo descartados do argumento, abrindo espaço para cada vez mais música e teatralidade, colocando demasiado foco no ansioso Miranda, que se procura provar no palco cinematográfico, em detrimento de Larson.

tick, tick…BOOM” é um filme teatral, over-the-top, com músicas orelhudas e outras dispensáveis, mas no seu íntimo é claro o que quer transmitir: recordar a vitalidade de um grande talento perdido.

Pontuação Geral
Daniel Antero
tick-tick-boom-talento-ansioso“tick, tick…BOOM” é um filme teatral, over-the-top, com músicas orelhudas e outras dispensáveis, mas no seu íntimo é claro o que quer transmitir: recordar a vitalidade de um grande talento perdido.