Uma das características (clichês) crónicos da crítica cinematográfica é apelidar de melodrama quando se gosta de um objeto cinematográfico dramático choroso (até se diz “na grande tradição do melodrama”), e de “telenovela” quando não se gosta e se acredita que existe em cena uma profunda manipulação e excessos para chegar à lágrima fácil. 

Essa manipulação emocional, mais ou menos evidente, está presente nos dois casos, e neste novo filme de Pedro Almodóvar é intrínseca já que se abordam temas capazes de provocar sentimentos primários e uma enorme comoção, como a maternidade, o luto, o amor e também as feridas históricas ainda por sarar num país com apenas quatro décadas de democracia.

Seja como for, Almodóvar não é um cineasta maniqueísta num ponto extremo ou cego por ideologias, por isso a forma subtil como tenta balançar todos os dramas presentes em cena, mesmo que alguns momentos se sintam apenas como meros gatilhos narrativos, é de valorizar, sentindo o espectador o filme o mais orgânico possível, dentro das reviravoltas (algumas mirabolantes) com que o guião nos presenteia. 

Interessado agora em “mães imperfeitas”, Almodóvar viaja com a sua atriz fetiche (Penélope Cruz) por entre a história de Janis, uma fotógrafa que engravida de um homem casado, Arturo (Israel Elejalde), e Ana (Milena Smit), uma  rapariga que ao contrário da fotografa não partilha a mesma emoção em ser mãe, já que a sua gravidez vem com um trauma associado. É no desfiar de uma relação entre as duas, que nasce no mesmo quarto hospitalar, que Almodóvar, com toda a compaixão e agilidade que lhe é comum, acompanha a vida paralela e interligada das duas mulheres, mostrando avanços e recuos, alegrias e tristezas, desafios e contradições, sempre evitando julgamentos, mesmo quando outras figuras no grande ecrã, onde se inclui a interpretada por Aitana Sánchez-Gijón, revelam atos fáceis de categorizar dentro do egoísmo e ausência de instinto maternal.

E essa tenuidade na abordagem estende-se também ao sub enredo que envolve a busca de Janis por uma licença para reabrir uma vala comum na vila da sua infância, na qual se crê estarem enterrados familiares desaparecidos dos tempos da Guerra Civil Espanhola. Curiosamente, o tema das vítimas da Guerra Civil tem progressivamente deixado de ser um tabu na cinematografia espanhola (tal como a questão da ETA), e Almodóvar é o senhor que se segue no manter viva uma discussão sobre os crimes do passado, enterrados pela lei da amnistia (ou da impunidade) em 1978.

No final, e embora longe de qualquer brilhantismo, Almodóvar entrega ao espectador um filme seguro, doloroso e meditabundo, onde a empatia do espectador pelas personagens é instantânea e revela-se inquebrável, mesmo perante os já referidos twists novelescos.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
Guilherme F. Alcobia
maes-paralelas-e-um-regresso-seguro-de-pedro-almodovarAlmodóvar não é um cineasta maniqueísta num ponto extremo e cego, por isso a forma subtil como tenta balançar todos os dramas presentes em cena, mesmo que alguns momentos se sintam apenas como meros gatilhos narrativos, é de valorizar