A natureza desacelera, as conversas são celebradas, o tempo flui entre passado, presente e futuro no mesmo espaço, e Jessica (Tilda Swinton) enleada por um som que só ela ouve, divaga entre o consciente e o subconsciente. Curiosa, obstinada, parte em busca da sua origem.
No seu primeiro filme fora das suas raízes, o realizador tailandês Apichatpong Weerasethakul quer um cinema evocativo, uma reflexão de cabeça cheia, onde o nada enche o seu lugar e o tudo vai-se refinando a uma respiração, um batimento cardíaco, um som.
Tendo experienciado Síndrome da Cabeça Explosiva, Weerasethakul quis reviver aquele distúrbio de sono e compôs um quebra-cabeças poético sem conclusão lógica, repleto de mistério e distendido para estimular o pensamento.
Jessica, com insónias, está em permanente vigília e vai sonhando a realidade. Nós acompanhamo-la pela selva urbana e a natural de Bogotá, afastando-nos gradualmente do enredo convencional de uma narrativa para algo inexplorado, enquanto cada nova iteração do som, com intervalos e circunstâncias variáveis, aumentam-nos o assombro e vai-nos impondo um estado meditativo.
Vencedor do Prémio de Júri em Cannes 2021, “Memoria” é um exercício espiritual com contornos de videoarte, feito de longas imagens e pouca acção. Aqui o tempo é um rumor e o som um drone, um mantra que vibra os elementos fundamentais da existência a se estenderem pelo infinito.