Seguindo a linha alegórica de duas figuras em extinção, um leopardo de Anatólia e um diretor de um Zoo que está em processo de transição do sector público para o privado, num “negócio das arábias”, o realizador turco Emre Kayis entrega ao espectador com este seu “Anatolian Leopard” um trabalho de ritmo lento e introspetivo, onde o silêncio e a expressividade do nosso protagonista (Uğur Polat) diz e mostra mais que qualquer palavra ouvida.

Premiado em Toronto,  “Anatolian Leopard” surge num formato multicamadas (drama, comédia negra, thriller e subtexto político e social) para contar uma história de mudança dos tempos, com o tradicional a dar lugar ao moderno, num negócio que só funcionará se o Leopardo da Anatólia, espécie que o Zoo tem no seu catálogo, estiver em boa forma. O problema é que o leopardo adoece, cabendo ao diretor do zoo resolver a situação, criando novos problemas que tornam a sua posição ainda mais frágil. A certo momento, esta figura outrora emblemática, tal como o leopardo do filme, sente que se tornou ele mesmo uma relíquia, um espectro de si mesmo que cada um usa e abusa em seu proveito. A solidão mostra aqui também o seu peso, encontrado o protagonista companhia numa mulher negligenciada que trabalha na sua esfera laboral.

Para a construção do seu filme, que também podemos considerar um objeto em extinção num mundo que vê entretenimento em imagens cada vez mais rápidas e frenéticas que preenchem o grande ecrã, as influências de Emre Kayis vão de Kaurismaki a Jia Zhang Ke, passando por Antonioni e Kiarostami, conseguindo com isto transportar-nos para um ambiente onde o peso da mudança e da submissão ganham terreno e acrescentam profundidade à reinvenção que se exige. Sim,  “Anatolian Leopard”  faz parte do lote do chamado “slow cinema”, e  talvez até seja um pouco longo de mais, mas sem dúvida recompensa o espectador com a desconstrução de uma personagem que no seu caminho para a extinção encontra novas ferramentas para sobreviver num mundo do qual se sente alienado.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
anatolian-leopard-alegoria-da-extincao “Anatolian Leopard” recompensa o espectador com a desconstrução de uma personagem que no seu caminho para a extinção encontra novas ferramentas para sobreviver num mundo do qual se sente alienado.