A Guerra da Bósnia (1992-1995) e as consequências dela têm conquistado a atenção do cinema como reflexo de uma tentativa de cicatrizar as feridas que ainda subsistem em carne viva. Ainda no ano passado, “Quo Vadis, Aida?”, sobre o massacre de Srebrenica, deu que falar em Veneza (e já este ano em Roterdão e Gotemburgo), mas o que realizador Igor Drljaca faz nesta sua quarta-longa metragem é tornar esse doloroso tema em periférico, preferindo antes centrar a sua atenção na nova Sarajevo que nasceu no pós guerra e que apresenta-se nos dias de hoje repleta de disparidades sociais, com o fosso entre ricos e pobres a ser cada vez mais escavado.

E pelos detalhes que o realizador nos entrega sobre o jovem Faruk e da avó com quem vive, percebemos logo que eles pertencem no pós-guerra à classe mais desfavorecida, vivendo num conjunto imenso de blocos de apartamentos nos limites de uma cidade cuja sua fortaleza branca de pedra (Bijela Tabija – The White Fortress) continua a ser uma atração histórica unificadora. Emprego também é algo que não existe para o rapaz, que num ato de pura subsistência divide a sua vida entre ajudar o tio a transportar sucata pelas ruas e negócios obscuros de transporte de jovens raparigas para um criminoso local. 

É numa ida a um centro comercial para “angariar raparigas” que Faruk dá de caras com Mona, uma adolescente tímida de uma família rica e politicamente poderosa, representativa da nova burguesia que a cidade viu nascer. Os dois vão flertar e enamorar-se como tantos outros, mas a suavidade e ternura que o realizador impõe nessa relação, em que cada um tenta entender e aproximar duas classes que os tempos e a guerra separaram, contrasta com os ambientes tensos que ambos têm de lidar no seu dia a dia. É que se Faruk tem um criminoso à perna como forma de sobrevivência num local que não tem nada para lhe oferecer, também Mona parece presa a um destino que passa por  ir viver para o Canadá, provavelmente numa viagem sem regresso.

Sem qualquer tipo de futuro para a relação, aos jovens resta aproveitar o escasso tempo que têm para juntar de alguma maneira o que o capitalismo, a política e o poder separaram após a guerra: pessoas da mesma cidade que vivem em condições de riqueza e pobreza diametralmente opostos, mas qualquer uma delas sem perspetivas de futuro ali, sem cair no crime ou na imoralidade da política e dos jogos de interesses(veja-se a cena no carro dos pais de Mona).

E se a Fortaleza Branca observa e une uma cidade através da sua história e localização, também vai servir de derradeiro refúgio para uma última reunião da dupla, tudo numa tarde solarenga que iniciará a predestinada separação mal a noite se apresenta.

Um pequeno e simples filme carregado, mas não escancarado, de mensagens políticas e sociais sobre uma geração e uma cidade, que chega aos nossos olhos com a roupagem de um romance adolescente condenado ao fracasso naquele espaço e naquele tempo.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
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