Enfiada na secção Perspektive Deutsches Kino, que explora o novo cinema alemão, mas com capacidades para figurar igualmente numa Panorama ou Fórum da Berlinale, Jesus Egon Christus pinta um retrato da psique e da sua degradação a partir de um jovem encerrado num centro de reabilitação evangélico, onde prima a terapêutica baseada na bíblia, de respostas fáceis, e não na ciência e nas complexidades das doenças mentais.

A fragilidade física e psicológica da nossa personagem central, Egon (Paul Arámbula, soberbo), um rapaz franzino com manifestações físicas da sua condição psíquica, é imediatamente apresentada através da sua expressividade corporal desconjuntada e silêncio absoluto, enquanto um “pastor” dirige-se a “crentes” cuja vida foi marcada pelas adições. 

Na verdade, o que assistimos ao longo desta longa-metragem de David e Saša Vajda é a uma substituição de dependências, com a religião centrada em Jesus e a mensagem do pastor a servirem de metadona, o que no caso de alguém com problemas do foro mental, certamente derivados de vários traumas, irá levar a uma degeneração psicológica de Egon e a sua interpretação da realidade.

Nos tempos nefastos do pico do crack nos EUA, em plenos anos 80, Nancy Reagan enchia as televisões com um Just Say No, simplificando e caracterizando o ato de sobriedade de um toxicodependente a uma decisão fácil, à qual bastava dizer não e amanhã é outro dia. Estes centros evangélicos estão espalhados por todo o mundo, e até José Barahona, na sua viagem pelo Amazonas em “Nheengatu“, deu com eles, enfiados no meio da selva, onde “tratam” principalmente situações de alcoolismo.

Já  esta dupla de cineastas partiu da sua própria investigação no bairro onde vivem, Berlin-Neukölln, onde são os opiáceos semi-sintéticos, como a heroína, os responsáveis principais por gerações completamente perdidas. E mais interessante – e triste de observar – é como esta droga voltou novamente a ser um problema na década de 2010, depois de todos os estragos que fez – principalmente nos anos 80 e 90 – que todos nós assistimos presencialmente nas nossas casas, ruas e cidades.

O filme mostra também isso na exposição de várias personagens de gerações diferentes, ora através dos que sobreviveram à calamitosa primeira vaga, ora aqueles que se agarraram a ela nos últimos anos à procura de “Just a Perfect Day”.

Esteticamente seco, onde o minimalismo e degradação imperam em cenas maioritariamente interiores despidas de qualquer empatia entre pessoas e o local, David e Saša Vajda entregam um pequeno filme repleto de significado e urgência, onde a ficção é entregue com grande sentido de “cinema do real”.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
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