Joe marca dois regressos: David Gordon Green às suas raízes independentes (apesar de já ter demonstrando que conseguia o retorno em Prince Avalanche, de momento em cartaz) e Nicolas Cage aos bons desempenhos. Talvez seja por isso que se consegue visualizar com agrado esta obra rodeada de personagens desprezíveis e um anti-herói (o homónimo Joe) tão desequilibrado e sedento de vingança como qualquer antagonista.

Contudo, apesar de tão bem vermos Cage a abandonar os papéis que tanto lhe deram má fama e Gordon Green a renegar as suas comédias de mau gosto (Real Desatino, Desbunda), Joe é um “cão raivoso” que ladra para todos os lados, imprevisível nos seus atos e sem razão para tal. É fomentado um conto de violência num EUA remoto e isolado em termos civilizacionais, onde são imensos os impasses narrativos em prol de uma construção quase divina e ao mesmo tempo forçada para a personagem que dá o título ao filme. Uma coisa é criar uma personagem complexo e sob constante desenvolvimento, outra é tentar “cultivar” em terreno árido – Joe pertencente à última opção, um filme que confunde barafunda com complexidade e desvios com desenvolvimento, vivendo da sua estética e da sua linguagem fílmica, o dito modo operativo indie.

Mas mesmo que o falhanço a nível de temática e de argumento (demasiado preguiçoso), o novo filme de David Gordon Green concentra desempenhos férteis por parte do seu elenco, e já não estamos a nomear Cage. Uma dessas louvadas prestações é a de Tye Sheridan, um jovem actor que demonstra uma capacidade de não conter frente a colegas veteranos. Como personagem, Sheridan compõe um exemplar forte e de fácil conquista para com o público, fundindo uma fragilidade de uma ainda “verde” longevidade com a rebeldia extraída dos primórdios da adolescência.

É que Joe, para além de um retrato de violência duma comunidade quase animalesca, apresenta um tom “coming-of-age” que tenta sobressair face a um esquizofrénico enredo. Outro destaque é Gary Poulter, que desempenha Wade (também apelidado de G-Daawg), o pai do personagem de Sheridan, mais outra figura miserável deste cenário cercado pela violência que de certo iremos odiar. Uma fantasmagórica e póstuma interpretação – Poulter faleceu dois meses depois do termino das filmagens e nunca viu o produto final – de um homem que tornou-se ator por acidente: um sem-abrigo que reviveu a pele do alcoólico antagonista, um mundo do qual provavelmente ansiava sair. Contudo, esta sua experiência como ator converteu-se num derradeiro encontro com a redenção.

Ainda assim, as interpretações não chegam a erguer este produto a todo o seu potencial, mas tendo em conta os resultados anteriores é imperativo pedir a David Gordon Green para instalar-se nas suas origens cinematográficas. Ansiosamente, esperemos que faça destas obras a sua residência e que não seja apenas uma visita.

Pontuação Geral
Hugo Gomes
joe-por-hugo-gomesContamos com um regresso do David Gordon Green às suas raízes ...