Com uma série de prémios consecutivos no cinema búlgaro, o ator, argumentista, realizador e professor Ivaylo Hristov é um dos grandes nomes do cinema e teatro local, prosseguindo a sua carreira com uma sátira desbocada em torno dos refugiados, que se fosse feita num país como França, por exemplo, explodiria certamente as bilheteiras com mil e um recordes.

Recorrendo a um preto-e-branco vívido que alicerça esta comédia social de tom político vincado (um primo búlgaro de “Adivinha Quem Vem Jantar“), tal com o seu anterior filme, “Losers” (2016), o era sob a capa coming-of-age, Hristov conta neste “Strah” (Fear) a história de uma viúva de uma pequena localidade que encontra – a meio de uma caçada – um migrante africano a caminhar em direção à Alemanha. Como “boa cidadã” que é, ela detém o homem, e tenta-o entregar às autoridades. Porém, estas recusam alojá-lo (já estão com as suas infraestruturas lotadas de outros), ficando a viúva da tarefa de dar abrigo ao homem, ou deixá-lo ao relento.

É aqui que as coisas complicam-se para a mulher, que acolhe o homem e é criticada e vítima de fofocas na localidade por viver com um negro. Políticos, cidadãos banais e meios de comunicação social saem muito mal na fotografia que Hristov pinta deles no que respeita ao racismo e xenofobia, transformando-se a comédia rapidamente num drama tenso quando a mulher começa a ser alvo de ataques por parte dos seus vizinhos.

Já tínhamos de aturar os ciganos e agora chegam os negros” são algumas das frases que se ouvem por aqui, demonstrando uma sociedade pobre, limitada em termos educacionais, a ser alimentada por uma imprensa sensacionalista que procura histórias de faca e alguidar no meio de travessias de esperança por uma vida melhor. E a questão da pobre educação do vilarejo é apontado em mais que uma camada, até porque esta mulher é uma antiga professora desempregada  – porque fecharam a única escola local – e a única figura que fala minimamente inglês no local é um miúdo de nove anos. Cabe à presidente da câmara local ser o alvo do político desactualizado, populista e sem qualquer capacidade para lidar com mais que o seu próprio umbigo.

No mais, existe uma força e aura de Antígona na protagonista feminina, Svetla (brilhante, Svetlana Yancheva), algo próximo da resiliência e preparação para guerra e o que der e vier de uma Frances McDormand em “Três Cartazes à beira da estrada” ou de Halldóra Geirharðsdóttir no brilhante “Mulher em Guerra”.

Um filme essencial – ainda que por vezes demasiado óbvio – para os tempos modernos, onde se questiona as motivações dos migrantes, e não se esquece o amor, o humor, o drama e até o terror. E quanto ao final, com a única imagem colorida a surgir, este apenas dá um tom fabulista a uma história de preconceito, perseguição e resistência.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
fear-mulher-em-guerraUm filme essencial - ainda que por vezes demasiado óbvio - para os tempos modernos, onde racismo e xenofobia permanecem em foco