Sexta-feira, 19 Abril

Porto/Post/Doc: a pronuncia do norte…

De Arcozelo a Leixões, passando pelo Rio Douro e sem esquecer Sério Fernandes

Um ano depois de exibir Chico Fininho, o certame nortenho dedica nova atenção ao seu realizador, Sério Fernandes, através de um documentário assinado por Rui Garrido, que foi aluno da Escola Superior Artística do Porto (ESAP), onde José Eugénio Sério Fernandes deu aulas e foi seu professor.

Sério Fernandes – Mestre da Escola do Porto – acompanha a vida do publicitário e realizador até aos dias de hoje, funcionando às vezes como uma biografia convencional entre entrevistas atuais e imagens de arquivo, quer dos seus filmes, quer de trabalhos de alunos que lecionou. O que é mais interessante é a análise entre o criador, o formador e o homem que Sério foi e é, de personalidade vincada e profundamente apaixonado pelos animais: não só os que alimenta e acarinha diariamente, mas também aqueles que já partiram e que ele mapeou mentalmente onde encontraram o último pouso.

E falando-se de Sério Fernandes fala-se igualmente da Bei Film, porta ao lado da sua num dos seus espaços, de algumas pessoas que por lá passaram, atritos que foram vividos, e o imenso espólio guardado em bobines e bobines empilhadas, as quais Sério apenas lamenta não ter enterrado durante as obras do Metro da Invicta.

É nestas afirmações que encontramos também o seu lado “teatral”, explícito igualmente quando carrega um quadro pelas ruas do Porto, ou lança para o mar uma bobine do filme Odisseias, de 1987, ou ainda quando no cimo de um monte relembra que muita poesia Eslovaca já se ouviu ali.

Noutra sessão, e depois de passar pelo doclisboa, e de sair de lá premiado, o documentário Viveiro de Pedro Filipe Marques, filmado de novembro de 2016 a dezembro de 2017, vai ser agora exibido no Porto/Post/Doc.

Trabalho de observação, com uma câmara maioritariamente estática (que ganha nova vida quando entra em campo), Pedro Filipe Marques mostra-se capaz de encontrar beleza (enorme sentido de posicionamento da câmera do cineasta) nos espaços mais vulgares e corriqueiros de um clube de futebol.

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Nessa viagem, vamos assistindo à dedicação, amor e paciência de algumas personagens que trabalham nos bastidores, em particular dos roupeiros, que entre máquinas e máquinas de lavar a roupa desportiva usada pelo clube nas suas atividades, nos vão falando do seu dia a dia, não escapando às cotidianas, algumas codrilhices e até estados de verdadeira impaciência quando nos jogos a sua equipa joga mal. Ouvem-se assim frases como “tinha de estar ali aquele morcão”, palavras que de forma humorística ecoam em verdadeiros quadros fílmicos criteriosamente montados.

É que se num dos momentos do documentário de Sério Fernandes, este declara o seu amor ao trabalho de um aluno (Agámémnon), explicando todo o poder de síntese que um quadro cinematográfico pode conter, Pedro Filipe Marques faz isso em quase todos os momentos do seu Viveiro, criando verdadeiras pérolas de realismo encenado, algumas vezes conduzidos até nós por meros reflexos.

O Viveiro tinha de ter uma estreia local e vai ter um enorme significado, porque o filme retrata uma coletividade desportiva de Arcozelo, que é aqui ao lado, e essa sessão vai ser o momento em que os intervenientes, aquela equipa de futebol, vai assistir pela primeira vez à obra no Porto/Post/Doc. Este momento de celebração é dos momentos mais bonitos do festival. Podermos ter os protagonistas, o objeto do filme, aqui, ao vivo na sala, a rever-se no ecrã. Isto é o cinema em todo o seu esplendor“, disse Dario Oliveira, diretor do festival, ao C7nema, sobre a importância da exibição desta obra a norte.

As tristes sombras no Rio Douro

Um dos trabalhos mais curiosos e sensíveis a serem exibidos neste Porto/Post/Doc é a curta-metragem Gastão, de Tânia Teixeira, objeto doloroso nas entrelinhas que acompanha um homem que na sua pequena embarcação vagueia pelo rio Douro com a missão de resgatar corpos de pessoas que encontraram ali o seu último destino. “Quando comprei o barco, que era para eu pescar, logo tive de ir buscar um corpo que se atirou da ponte. A partir daí assumi isto como uma prova de fazer bem ao próximo“, diz Gastão Teixeira, o nosso condutor nesta viagem rio a dentro…

O Genius Loci do Porto de Leixões

Na sua nota de intenções, a realizadora Renata Sancho afirma que o objetivo deste primeiro episódio de uma série documental localizada no porto de Leixões era “reconstituir o Genius Loci“, ou seja, o espírito do lugar. E consegue-o neste Panorama, trabalho profundamente sensorial onde num verdadeiro passeio vamos mirando a maior infraestrutura portuária artificial a Norte de Portugal, repleta de sons característicos, quer naturais (gaivotas ou o mar), quer artificiais (apitos, sirenes das embarcações, contentores em movimento).

E é uma viagem a olhar para a faixa costeira, mas também para as áreas habitacionais que acompanham a estrutura, fundindo-se todos estes sons e imagens naturais e industriais com o fervilhar das cidades, dos carros que nelas vagueiam, e das pessoas que as preenchem.

Um trabalho notável, sem diálogos, que transporta o espectador para uma verdadeira “experiência de permanência naquele espaço “.

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