No dia em que (mais) um golpe militar avançou em Myanmar, da vizinha Tailândia chegou ao Festival de Roterdão, em estreia mundial, “The Edge of Daybreak”, a primeira longa-metragem de Taiki Sakpisit, que há dois anos surgiu no certame com a curta “The Mental Traveller”.

Trabalho profundamente sensorial, que carbura lenta e poeticamente a história de uma família militar derrotada pelos traumas provocados pelos golpes militares que afundaram o país na incerteza (1976 e 2006), “The Edge of Daybreak” é filmado num preto e branco desolador onde a luz frequentemente nos encadeia, resultando num exercício atmosférico que transpira violência, mesmo quando nas cenas está ausente qualquer grafismo.

Ao invés, essa dor e luto sente-se no ar, e Sakpisit usa sonhos, espaços, memórias e alguns diálogos narrados por Ploy – uma mulher que, deitada na cama com o amante, o  irmão mais novo do seu marido – para reviver toda uma história pessoal e coletiva carregada de fantasmas, dúvidas e mágoas.

A banda-sonora acentua o tom lúgubre permanente da fita, cujo objetivo final é lançar uma seta no coração dos tempos atuais, onde, mais uma vez, a incerteza política, acentuada por um outro golpe militar em 2014, e sucessivas repressões aos estudantes, dificulta qualquer processo de cura das feridas do passado.

Além disso, este é também um filme sobre o amor maternal que várias vezes imprime simbolismos (histórias de sótãos, ratos, cobras e cães/cenas de matança de animais) para mostrar uma família e uma nação num permanente estado de stress pós-traumático, incapaz de encontrar rumo e saída da negritude que percorre as veias da sua história mais recente.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
the-edge-of-daybreak-a-tailandia-e-um-pesadelo-sem-fimTrabalho profundamente sensorial que carbura lenta e poeticamente a história de uma família militar derrotada pelos traumas provocados pelos sucessivos golpes militares