Estreado mundialmente no SXSW e exibido no IndieLisboa, “Cesária Évora” chega às salas comerciais nacionais como um retrato sentido, sólido e impactante, não apenas de uma das cantoras mais marcantes do século XX, mas igualmente de alguém com muitas particularidades deliciosas e que carregou no corpo a história do seu tempo.
Por isso mesmo, a cantora e a mulher cabo-verdiana de origens humildes confundem-se e misturam-se num documentário que tanto visita o seu lado mais bem-disposto, como também nunca tem medo de abordar os momentos mais sensíveis da sua vida, ora relacionados com consumo excessivo de álcool (que a ajudou a ultrapassar a timidez de subir ao palco), ora dos problemas do foro psíquico, como a depressão, que a obrigaram a fechar-se entre quatro paredes e motivaram o adiamento de várias tournées.
Fugindo na sua totalidade ao registo das “cabeças falantes”, que frequentemente invade os ecrãs nos documentários biográficos nacionais recentes (“Zé Pedro Rock n’ Roll“;”Um Punk Chamado Ribas“) , Ana Sofia Fonseca construiu o seu filme recorrendo a material de arquivo, cruzando com as as vozes dos muitos que fizeram parte da vida da cantora, como a sua neta Janette Évora, ou o antigo manager e amigo próximo da artista, José da Silva. Nesse arranjo, o trabalho da montadora Cláudia Rita Oliveira não é de menosprezar, incutindo esta uma estrutura que nem sempre é linear, mas que nunca se perde entre os vários episódios de vida retratado.
No final sobressai, principalmente, uma figura ímpar e o seu humor, que algumas vezes leva mesmo o espectador ao êxtase do riso, como demonstra aquela cena em que Cesária partilha o ecrã com o cubano Compay Segundo.
Por estas razões, “Cesária Évora” merece uma olhadela e não apenas dos fãs da cantora.
