Não são raras as vezes que observando o filme de Peter Kerekes, “107 Mothers”, nos sentimos enclausurados numa prisão ucraniana juntamente com as mulheres que atuam nesta ficção que teve a sua estreia mundial em Veneza e que “aterrou” agora em San Sebastián.

E convém referir ficção porque todo o filme, nos seus 90 minutos, dá-nos a sensação de um objeto processado através do cinema documental, seguindo os seus códigos, como se vê logo na primeira cena, na qual temos acesso a todo um “realismo em marcha”: Leysa (Maryna Klimova), uma reclusa, dá à luz num quarto de hospital sob o olhar de Iryna (Iryna Kiryazeva), uma guarda prisional. A relação entre essas duas mulheres será acompanhada a distância durante o filme, que tem como peça central o facto de, na Unidade Correcional Número 74 de Odessa, as mulheres poderem cumprir a pena com os filhos até estes fazerem três anos, cabendo depois aos tribunais decidir se elas são soltas antes do tempo (liberdade condicional) e levam os filhos, ou ficam detidas, sendo os miúdos entregues para adoção.

E esse é o principal dilema da prisioneira que acompanhamos com mais atenção, já que ela não adquire a liberdade condicional e terá de encontrar alguém próximo que tome conta do miúdo. Uma jornada complexa como veremos.

Numa entrevista, Kerekes disse que o seu filme nasceu como uma observação da censura e vigia permanente das reclusas, mas que depois evoluiu noutro sentido, focando-se em questões de maternidade e redenção, até porque os crimes que estas mulheres cometeram têm múltiplas géneses, embora o ciúme perante os parceiros (alguns assassinados) esteja no topo das “razões”.

A verdade é que o filme do cineasta eslovaco bebe muito de histórias verídicas passadas nas prisões ucranianas, confrontando assim o conceito de verdade com o de “ficçao”, entregando um filme sobre novas oportunidade fragilidades e arrependimentos.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
107-mothers-maternidade-e-redencaoTodo o filme, nos seus 90 minutos, dá-nos a sensação de um objeto documental, mas é ficçao