Terça-feira, 16 Abril

‘The Good Lord Bird’: o regresso alucinante de Ethan Hawke

Série do Showtime pode ser vista na HBOPortugal

Adaptada a partir da obra literária de James McBride e com a produção de Jason Blum – que nos últimos dois anos trabalhou em filmes como“BlacKkKlansman“, “Glass” e “The Invisible Man”  -. ‘The Good Lord Bird’ é uma versão ficcional da vida do abolicionista John Brown e aborda o ataque a Harper’s Ferry em 1859, que precedeu a Guerra Civil Americana.

As origens

James McBride acredita que o humor pode abrir caminho para “conversas difíceis” sobre a história racial da América. Pelo que vimos do primeiro episódio de ‘The Good Lord Bird’, humor negro [muitas vezes bizarro e distorcido] é o que não falta neste revisitar de uma das personagens mais controversas da história norte-americana, John Brown, um abolicionista – herói para alguns, um terrorista assassino para outros.

Nascido em 1800 em Torrington, Connecticut, John Brown vivia uma existência pacifica como pastor de ovelhas e comerciante de lã até ao assassinato em 1837 do abolicionista Elijah Parish Lovejoy, baleado e morto por uma multidão pró-escravidão em Alton, Illinois, durante um ataque a um depósito de Benjamin Godfrey e W. S. Gillman, onde os materiais abolicionistas de Lovejoy estavam armazenados.

Indignado, Brown anunciou publicamente a sua dedicação à erradicação da escravatura e até 1850 – ano da aprovação do Fugitive Slave Act – serviu como “condutor” na Underground Railroad, uma rede de rotas clandestinas existente nos Estados Unidos que era usada para a fuga de escravos para os estados do norte ou para o Canadá, livres da escravatura.

Tragic Prelude, ca. 1938-1940, John Steuart Curry.

Em 1855, Brown seguiu para o Kansas, onde já se encontravam os seus filhos, mas em 1856 as forças pró-escravatura saquearam e queimaram a fortaleza anti-escravatura de Lawrence, na região. A vingança – ou a “justiça” que Brown apregoava – levou-o a capturar cinco colonos de três diferentes famílias pró-escravatura que viviam ao longo do rio Pottawatomie, massacrando-os. Esses assassinatos colocaram Brown no palco abolicionista nacional e criaram uma divisão profunda no forma de retratar a figura: rebelde ativista ou terrorista?

O John Brown de Ethan Hawke

Consciente em entregar uma obra de ficção de puro entretenimento, mais que um objecto histórico completamente fundamentado, o John Brown interpretado por Ethan Hawke (em modo alucinado a fazer lembrar Nick Nolte) é um devoto extremo, um mau pregador que atormenta a família com as suas preces, um vingativo justiceiro, mas igualmente uma figura gentil, como se vê na sua relação com um escravo, Henry, que “resgata” numa das primeiras cenas da série.

Estranhamente colocado em roupas de mulher, esse escravo, agora com a alcunha Onion, inicialmente vê John Brown como um louco facínora, fugindo dele e até desejando reencontrar o seu dono e voltar para casa. Mas voltas e voltas, perdido em território hostil, Onion regressa para junto de Brown e assiste em primeira mão às suas ações, narrando-as, e colocando-o bem longe de uma figura tradicional no entretenimento norte-americano: o ‘branco salvador’.

Albert Hughes (From Hell) assinou um primeiro episódio repleto de personagens fascinantes por descobrir, tiroteios bem encenados e um sentido de humor muitas vezes perverso, não vangloriando nem denegrindo a sua figura central – Brown – mas colocando-o na esfera imediata da ambiguidade, para o bem e para o mal.

Notícias