Sábado, 27 Abril

Meu Nome É Gal: Um canto político

Dos ecrãs do Festival de Veneza, onde foi vista em “The Killer”, de David Fincher, para a Bahia da novela “Renascer”, atualmente em exibição na TV Globo do Brasil, Sophie Charlotte atingiu uma espécie de apogeu profissional com a consagração do seu desempenho em “Meu Nome É Gal”. Hoje no cartaz dos cinemas portugueses, o filme teve uma sessão de gala no Festival do Rio 2023, onde a atriz conversou com o C7nema. Na ocasião, (re)viver os feitos da cantora Maria da Graça Costa Penna Burgos (1945-2022) era um gesto político.

Fazer cinema no Brasil virou um ato de resistência”, cada vez mais difícil, porém, cada dia mais necessário”, explica Sophie, que saiu de “O Rio do Desejo” diretamente para este biopic dionisíaco, avesso às fórmulas do género. “Levo este filme ao circuito comercial com a esperança de ver as pessoas regressarem em peso às salas de exibição”.

A realização cabe à dupla Dandara Ferreira e Lô Politi, que delimitam a trama de 1966 a 1971. É uma referência direta à ditadura iniciada em 1964 e encerrada em 1985. Em meados dos anos 1960, Gal chega da Bahia em busca do sonho de firmar uma carreira sob os holofotes de uma Música popular brasileira (MPB) do tempo dos festivais da canção. Entre o Rio de Janeiro e São Paulo, ela é dragada para uma zona penumbrosa, de cor plúmbea, da mordaça que o Golpe de 64 e o Ato Institucional n°5 (AI-5, gesto de censura) a amarraram naquele país.

Meu Nome É Gal

Encontrar-me com a Gal, antes da sua partida, para conhecer como ela era, foi algo de muito afetuoso. Foi uma experiência muito rica de pesquisa. É um caso daqueles em que paixão e o estudo se misturaram na composição de uma personagem real”, explica Sophie, falando da atmosfera sensível por trás de uma trama de tons belicosos.

Quem estava em guerra no tempo redescoberto pelo filme era o Brasil. É sobre essa instituição, um país, que o filme fala. Um país que submeteu as mulheres a opressões simbólicas e físicas. A voz de Gal entra em cena como um brado de ruptura, que ecoa com mais força ao esbarrar nas paredes do governo fardado que permaneceu por 21 anos no Poder, em Brasília.

O meu maior aliado nessa jornada pelas vivências de Gal foi o tempo. Tive tempo de mergulhar nos fonogramas e em toda a iconografia da época, antes mesmo do trabalho com o elenco”, diz Sophie, que é fotografada na película pelo DP Pedro Sotero (de “Aquarius”).

Dos satélites que cruzam o caminho de Gal, a presença atómica de George Sauma, como Wally Salomão, é uma explosão nuclear de carisma que merecia um filme à parte. “Gostaria muito que este filme rendesse spin-offs. Era bom ver o filme do Caetano, do Gilberto Gil, do Wally… de cada um”, diz Sophie. “O encontro com o material histórico dos dias em que esse povo fez arte para revolucionar o Brasil foi fundamental para a transformação no meu corpo e na minha voz”.

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