Estima-se que a Guerra Civil na Guatemala, que decorreu entre 1960 e 1996, e que opôs o governo militar e vários grupos de guerrilha, produziu qualquer coisa como  150000 vítimas, 40000 das quais consideradas desaparecidas. 

Recentemente, o mundo do cinema tinha ganho consciência da dimensão do massacre fruto ao vencedor da Câmara de Ouro em Cannes, “Nuestras Madres”, de César Diaz, uma peça de ficção que explorava a identificação de corpos encontrados em valas comuns, tudo a partir de familiares no presente que tentam descobrir o que aconteceu aos seus entes queridos.

Chegados a 2021, o cinema guatemalteco volta a tocar no tema através de um objeto de investigação histórica, “El silencio del Topo”, centrado em Elías Barahona, “El Topo” (A Toupeira), um jornalista que se infiltrou nas entranhas do governo mais repressivo da história da Guatemala, liderado pelo General Fernando Romeo Lucas Garcia (1978-1982)], trabalhando para o Ministro do Interior, Donaldo Ruiz. 

Anais Taracena começou a filmar Elías Barahona em 2014, mas duas semanas depois deste testemunhar num julgamento por crimes contra a humanidade ocorridos durante a guerra civil, morreu. É então que ela parte para descobrir mais sobre esta figura, fazendo-o com todos os recursos cinemáticos que tem à mão (esteticamente o filme vai além de um trabalho jornalistico), sejam pessoas que o conheciam e trabalhavam como ele, as poucas que se dispõem a falar dele e consequentemente da vida durante a ditadura, seja através de material de arquivo que mostra o próprio, o qual agia como espião no governo, salvando assim nas sombras dezenas e dezenas de pessoas de serem sequestradas e assassinadas.

Tal como a maioria das ditaduras que afligiram o terreno das Américas na segunda metade do século XX, rapidamente a luta anti-comunista transformou-se numa caça a qualquer forma de oposição, desfiando Taracena um novelo de crimes, que o mundo das artes da Guatemala (cinema e especialmente literatura) têm começado mais intensamente a escavar desde os anos 90.

O resultado final deste “El Topo” é um ensaio duro que mais uma vez funciona como reflexão a um passado marcado pelo extremar de posições políticas e ideológicas de um conjunto (a Guatemala), além de servir como objecto de memória e homenagem pessoal a Elías Barahona, sem nunca glorificar as suas ideias, mas acima de tudo a sua coragem, espírito de combate e sacrifício.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
el-silencio-del-topo-a-historia-de-uma-toupeira-na-ditadura-guatemaltecaUm ensaio duro que mais uma vez funciona como reflexão a um passado marcado pelo extremar de posições políticas e ideológicas de um conjunto (a Guatemala), além de servir como objecto de memória e homenagem pessoal a Elías Barahona