Sexta-feira, 26 Abril

«In Grazia di Dio» por Hugo Gomes

A crise financeira e a austeridade servem novamente como conflito para mais uma produção italiana fincada no realismo formal. No novo filme de Edoardo Winspeare, In Grazia di Dio, a severidade dos nossos tempos leva quatro mulheres, de gerações diferentes, a desfazerem-se das suas vidas passadas e imperativamente subsistirem daquilo que a terra lhes dá. O espectador é constantemente remetido a um jogo de cumplicidades entre o quarteto protagonista e as suas “armas” de combate, as quais convertem em desesperadas atitudes de sobrevivência. Assim, vislumbramos uma panóplia de confrontos geracionais, todos descritos no feminino como se de um filme de Ozon se tratasse .

Até aqui tudo bem, nada que não tenhamos visto anteriormente, e infelizmente sob temáticas mais criativas e dinâmicas (basta ver por exemplo o caso de L’Interprido, apresentado na 8 1/2 Festa do Cinema Italiano de 2014). In Grazia di Dio prolonga-se recorrendo a um teor novelesco que defere todas as suas hipóteses de reconciliação com o cenário realista que falsamente realça, sendo frequentemente “assaltado” por um humor subtil disfarçado de caricatura das personagens, todas elas dignas de abençoadas “segundas hipóteses” e de, por vezes rebuscadas, ambiguidades.

Porém, Celeste Ciasciaro consegue oferecer-nos, não apenas um desempenho forte, mas a personagem mais desenvolvida e conciliadora do leque. A proclamada “chefe de família”, Casciaro, funciona como a força desta intriga que é dilacerada por ideias vencidas, voltando a frisar a ingenuidade do argumento contra o sistema capitalista e tecendo um maniqueísmo social aprofundado como uma solução credível.

Moralidades à parte, In Grazia di Dio possui outra fragilidade: a sua duração. As suas duas horas e pouco parecem uma eternidade devido a um conjunto de sequências inúteis e entulhadas, sem sequer possuírem um cariz artístico ou experimental.

O mesmo ponto de vista e o estilo mais corriqueiro, elementos comuns do realismo cinematográfico, tornam a obra de Winspeare num projeto banalizado e, no seu todo, fragilmente distorcido. De certeza absoluta que não foi com a graça de Deus que este filme não conseguiu vingar.

O melhor: Celeste Ciascaro
O pior:   nada de novo, e por vezes demasiado ingénuo, neste “encanto” retrato sobre a austeridade financeira


Hugo Gomes

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