Sexta-feira, 26 Abril

«Vanishing Point» por Hugo Gomes

Apesar do titulo, a primeira longa-metragem do tailandês Jakrawal Nilthamrong (Patterns of Transcendence) não tem qualquer relação com o filme de culto que Richard C. Sarafian concretizou em 1971, ainda que em ambas as obras as viaturas marquem presença de uma forma crucial na narrativa, embora, como é óbvio, sob divergentes abordagens.

Nilthamrong executa um obra pessoal que transfere para o grande ecrã uma dor intima: é uma tragédia de família ocorrida a 17 de setembro de 1983, onde os pais do realizador sofreram um desolador acidente de viação, evento que marcou para sempre a história da família.

Vanishing Point arranca com fotos do jornal do acidente, uma ocorrência que logo Nilthamrong tenta exorcizar através de um enredo fictício, contemplativo, sobre dois homens que tentam lutar contra as suas dores interiores. O cineasta tailandês disse que fazer um filme é como tocar jazz, pois o improviso é a combustão de toda a melodia, energia que este tenta transmitir numa obra onde essa mesmo energia está ausente, mas que glorifica a emancipação da câmara. Tal como Antonioni, Nilthamrong centra-se num enredo acentuado pelas suas pausas e pela derivação no mundo em redor, suplementado por um olhar de um documentarista, evidenciando os anteriores trabalhos do realizador. Contudo, mesmo dotado de uma câmara fluída e articulada com mestria, Nilthamrong falha em conseguir tecer um propósito para toda a intimidade.

As primeiras cenas, uma encenação masturbatória para com o crime em si, são desvanecidas por imagens vazias. O misticismo também faz parte desta fantasia torturante e fetichista, como se o cineasta a tornasse um escape para a dor real que vive constantemente e que dificilmente esquece. É pessoal, mas esta auto-interpretação prejudica demasiado o seu talento, acabando por demonstrar uma ausência de um objetivo mais definido do que somente em captar o desgosto alheio.

O melhor – A primeira sequência, a câmara de Nilthamrong
O pior – um filme demasiado intimo e pessoal para ser transmitido ao público. Necessitava de uma separação desses mesmos termos.


Hugo Gomes

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