Sábado, 27 Abril

«Le Week-End» (Fim-de-Semana em Paris) por Hugo Gomes

Do we mean love, when we say love?” já dizia o dramaturgo e escritor Samuel Beckett, citação essa, referenciada neste Fim-de-Semana em Paris, um regresso do realizador Roger Michell ao seu sensível olhar à velhice (setes anos depois do seu esplêndido mas discreto Vénus).

Nesta sua nova obra, o espectador segue o casal Nick e Meg (Jim Broadbent, Lindsay Duncan), casados há mais de trinta anos, que tentam aproveitar uma segunda lua de mel em Paris, a cidade das luzes. O que prometia ser um fim-de-semana romântico de um casal conformado, torna-se numa nostálgica reflexão das suas vidas amorosas e a questão de se é possível manter o amor com o avançar da idade.

Mais do que uma comédia romântica que o trailer sugeria, este Fim-de-Semana em Paris é um ensaio que não procura agradar ao espectador mas que encaixa nos atores, e apesar de se sentir, a certo ponto, que estes andam à deriva, no final conduzem o filme para a direção desejada e preenchem as suas personagens com identidade e visão. Ambos, sob uma invejável química e sinceridade no cruzar dos seus olhares, rumam numa jornada à dissecação da tão amada palavra “amor”: os seus significados, as suas heresias, hipocrisias e natureza. Amor que poderia servir para criar intermináveis romances ou histórias passionais é visto como um cinismo incontrolável por esta dupla em perfeita simbiose mas ao mesmo tempo auto-destrutivo.

É sob essa subestimação do sentimento que nos é apresentado outro tipo de romance, pouco apelativo para o cinema, diga-se por passagem, que não é a paixão mas sim o afecto, a estima e a valorização da sua “cara-metade”. Valores esses induzidos numa narrativa descontraída que salienta e homenageia o cinema de Godard, quer pelas evidentes referências quer pelos diálogos recorrentes ao existencialismo ou às frases soltas mas profundas. Por fim, e como trunfo, Jeff Goldlum presenteia-nos com uma interpretação de qualidade, roubando cada cena que surje. Como se costuma dizer, para dançar o tango são precisos dois, mas neste caso o tango é dançado a três (quem assistir ao filme perceberá o trocadilho).

À primeira vista tudo soava como um spin-off da trilogia de Richard Linklater – um casal, uma cidade – mas Fim-de-Semana em Paris tem vida própria. Focando-se de novo na velhice como ponto de partida, Roger Michell é um dos mestres do romance cinematográfico actual.

O Melhor – Jeff Goldblum e as referências a Godard
O Pior – ser confundido como uma comédia romântica ao estilo de Notting Hill


Hugo Gomes

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