Partindo do pressuposto que os sonhos são uma expressão mais directa do nosso subconsciente, onde, apesar disso, reagimos a uma realidade própria que pode incluir elementos exteriores, como um despertador a tocar insistentemente, “Inception” centra-se numa equipa que explora essa dualidade dos sonhos, criando um ambiente de sonho planeado para extrair informação a vítimas, numa vertente futurista de espionagem industrial. Depois de um trabalho que correu mal, a equipa é contratada, mas desta vez para fazer o contrário: introduzir uma ideia num alvo.

A primeira metade do filme mostra e explica as regras deste procedimento e a preparação para “o Golpe” e está construída exactamente como um desses filmes em que se prepara um golpe a um banco ou a um casino, onde se vê a construção de uma nova equipa, a análise e a procura de ideias criativas para ultrapassar as dificuldades e o definir de papéis para cada um dos elementos. Com o carácter onírico do golpe, esses papéis são um pouco diferentes, mas tornam-se claros à medida que o filme avança. A segunda metade do filme é um misto de filme de acção com um jogo de computador, onde o sincronismo e o tempo são essenciais para o sucesso da missão.

Apesar da unidimensionalidade de algumas das personagens, que acabam por reduzir-se ao seu papel no plano, apesar de algumas falhas na história e apesar dos problemas de empatia, este é um dos melhores filmes do ano. Inteligente sem ser arrogante, mantém – exige, mesmo – a atenção do espectador até ao final, com uma história que, mesmo complexa, é compreensível, jogando com a sensação de confusão e de curiosidade que são recompensadas mesmo antes do final. Christopher Nolan já o tinha feito antes em “Memento” e torna-o a fazer aqui, substituindo a estrutura fragmentária não-linear da memória, pela introdução de diferentes níveis, sem nunca perder o interesse ou a coerência.

Nolan procurou evitar a utilização de computadores na criação de alguns dos efeitos especiais mais impressionantes dos últimos anos que, associados ao seu estilo visual sombrio e sublinhados pela banda sonora magnífica de Hans Zimmer, contribuem para o ambiente perfeito para um filme que se passa quase na totalidade em sonhos. Sem dúvida que, para além das outras nomeações que poderá levar, este filme será nomeada em várias das categorias técnicas dos Oscars dentro de alguns meses.

Para além de qualquer defeito que se lhe possa apontar, este é um filme que, como qualquer pesquisa na internet revela, provoca um aceso diálogo sobre o que se passa nele e é revigorante ver um blockbuster que se recusa a reduzir-se para agradar a um qualquer departamento de marketing sem imaginação, com os seus grupos-alvo e estatísticas. Este é, sem qualquer dúvida, um dos filmes do ano e, com sorte, o primeiro de uma tendência para fazer filmes inteligentes para adultos.

(crítica originalmente escrita a 28 de Julho, 2010 10:15)

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João Miranda
Jorge Pereira
Hugo Gomes
Guilherme F. Alcobia
inception-por-joao-mirandaSem qualquer dúvida, um dos filmes do ano e, com sorte, o primeiro de uma tendência para fazer filmes inteligentes para adultos.