Filme de tribunal contido e restrito a uma única locação – uma sala tão claustrofóbica como libertadora-, “The Goldman Case” (O Caso Goldman) segue um julgamento que dominou as atenções e dividiu a França em 1976, no auge das ideologias políticas a fervilhar após o Maio de 1968, onde a luta armada era um destino.

No centro deste novo filme de Cédric Kahn está Pierre Goldman, um ativista francês de extrema esquerda, virado para o banditismo, que é acusado, entre outros crimes, de assassinar um conjunto de pessoas durante um assalto a uma farmácia. E se ele assume com relativa facilidade outros crimes que praticou, como vários assaltos violentos em diferentes espaços comerciais, neste caso específico refuta todas as acusações, falando em manipulação de provas e das testemunhas por parte de uma polícia genericamente racista e antissemita.

Kahn, que continua a dar cartas na atuação e realização, interessou-se primeiro em fazer um biopic sobre Goldman, reduzindo depois a escala, transformando o seu drama num espetáculo eletrizante de retórica e confrontos ideológicos, sempre com a energia das palavras e da montagem (excelente trabalho de Patrick Ghiringhelli) a calibrarem a nossa atenção até à chegada dos créditos.

No aspeto mais positivo, os diálogos e a forma sensata e frenética como o realizador os capta, movem o espectador para a teatralidade de um tribunal. Nesse aspeto, é sempre apoiado por um protagonista em estado de graça, interpretado de forma soberba por Arieh Worthalter, que chama a si todos os holofotes e atenção. E existem vários momentos brilhantes, como aquele em que Pierre aponta com os dedos em forma de arma a um polícia no tribunal, recriando uma situação da noite em que duas farmacêuticas e uma outra testemunha foram mortas durante um assalto. Ou então quando clama que é inocente porque o é, afastando o cenário de que as testemunhos do seu caráter e conduta tenham alguma coisa a ver e contribuir para isso. Pierre quer, acima de tudo, que o julgamento se resuma a factos e não ao seu passado e capacidade para fazer aquilo que é acusado.

É que, como já foi mencionado atrás, Goldman afirma-se inocente em relação a este caso especifico, mas assume outras ilegalidades e uma luta contra o sistema, revelando nesse caminho enormes dificuldades de relacionamento com o pai, que quando entra no tribunal para testemunhar a favor do filho acrescenta uma dimensão familiar a toda a questão.

Mas guerra de Pierre não é apenas movida contra o sistema, que inclui justiça, a polícia e até a sua família, mas até mesmo para o seu advogado, adicionando assim diversas situações de humor que trazem alguma ligeireza e frescor a um drama de tribunal com forte cariz sociopolítico.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
the-goldman-case-o-frenetico-regresso-de-cedric-kahnUm belo filme para a abertura da Quinzena de Cineastas em Cannes.