Já passaram 9 anos desde que Ulrich Seidl terminou a sua trilogia “Paraíso“, fazendo de seguida dois documentários que lhe retiraram alguma visibilidade nas salas de cinema, mas nunca empalideceram a sua forma provocante e sombria de fazer cinema e retratar personagens pífias e decadentes, todas elas com uma “cave” escondida dentro de si onde se acumulam os segredos e fetiches mais sombreados.

Seguindo as formas, tópicos e transgressões que costuma oferecer, onde não faltam cenas de sexo sem pudor e segredos obscuros, o austríaco regressa agora à ficção com “Rimini”, um drama onde não falta humor negro, disfunções familiares e até um olhar político e social, onde a decadência da estância balnear ressoa igualmente na do nosso protagonista, Ritchie Bravo (Michael Thomas, soberbo), um cantor de temas “schmaltzy“, gigolo profissional e filho dedicado ao seu pai internado num lar.

Os primeiros momentos do filme mostram Ritchie e o irmão a prepararem o funeral da mãe, o que o leva de Rimini, onde vive e trabalha (oficialmente), à Áustria. O gelo cobre mesmo a areia da praia, o sol é abalroado pela neblina, e nas ruas apenas encontramos imigrantes que estão sentados ou deitados, sem nada para fazer, como se estivessem à espera do verão e do trabalho sazonal.

Invernal, a roçar o glacial, também é a relação de Ritchie com a filha, Tessa, que ele abandonou há largos anos e sobre a qual falhou em toda a sua educação. Tessa encontra o pai e exige que finalmente ele a ajude na vida, pedindo uma soma monetária que serve de fachada para as desculpas que quer ouvir, de verdadeiro remorso.

Tal como a Rimini que olhamos sempre enevoada e glaciar, as personagens, histórias e atmosfera do filme são permanentemente lúgubres e anteveem a chegada de Ritchie ao abismo e ruína, ao final de um apogeu. Um final que ele teima não aceitar, multiplicando-se em palavras, cantadas ou ditas, sempre “con molto amore”. Aqui, quer sejam corpos, mentes, vidas, espaços ou personagens, tudo está invariavelmente em sentido decrescente, numa verdadeira época baixa. Por tal, está na altura de fazer emendas, adaptar e sobreviver. E é na transformação da sua relação com a filha, que ocorre simultaneamente à degradação mental do pai, que Richie volta a estar no centro das atenções, mas nunca no topo do seu próprio “jogo”.