Depois de desconstruir o género musical com a infância de Joana D’Arc, Bruno Dumont sob o gosto das sequelas (anteriormente concebeu a continuação de P’tit Quinquin) prossegue na história da criança abençoada que desafia um exército, para no final cair nas mãos daqueles a quem jurou defender.

Jeanne vem apimentar o rol de variações da mítica história da canonizada jovem que mudou o rumo da História da França. Dumont persiste na ainda pequena Lise Leplat Prudhomme, de volta no papel da heroína, o que atribuirá uma outra interpretação na luta de Joana D’Arc (aqui transmitida como uma “birra de uma criança”). Diríamos que é através desta persistência na incoerência [a escolha de uma atriz de 11 anos para interpretar um papel com os seus 19 anos] é somente o esboço do sentido de falsidade que Dumont quer submeter a este Jeanne, num regresso da teatralidade e de todo o artifício imaginário que o anexa. Depois do musical, é o épico a ser vítima dessa desconstrução; é a distorção das leis fixas da arte ficcional cinematográfica que o cineasta explicita a sua jornada pelo “faz-de-conta” sintetizado.

É o apontar a um amontoado de pinheiros e ver Paris, é o julgamento sob o efeito “dramático” de um Monty Python (cada juiz tem o seu irrisório maneirismo) e a inexpressividade da sua protagonista a fazer frente a (sobr)expressividade de Maria Falconetti na mais famosa incursão cinematográfica da figura histórica – A Paixão de Joana d’Arc, do dinamarquês Carl Theodor Dreyer.

Mas se em Jeannette, Dumont tomou os seus devidos riscos, nesta previsível sequela agarra o dispositivo como algo garantido. O filme já não avança e apenas contempla a sua postura passiva de um “amadorismo” voluntário, assim como a “pequena” Joana olha para o céu, ouvindo atentamente os monólogos cantados de Deus.

(crítica originalmente escrita no dia 19 de maio de 2019)

Pontuação Geral
Hugo Gomes
jeanne-por-hugo-gomesBruno Dumont reimagina a história de Joana D'Arc, dois anos depois de ter fustigado a sua infância. Mas a criança ainda se mantém.