Sexta-feira, 19 Abril

Martin Scorsese critica a falta de curadoria nas plataformas de streaming

Num ensaio para a Harper’s Magazine, refletindo sobre a carreira de Federico Fellini, o realizador Martin Scorsese lamentou como a nova era do streaming e os novos operadores de média tornaram a palavra “conteúdo” banal na discussão em torno de filmes, mostrando-se ainda preocupado com a falta de curadoria por parte das plataformas globais.

Ainda há quinze anos, o termo ‘conteúdo’ era ouvido apenas quando as pessoas discutiam o cinema num nível sério, e era contrastado e comparado com ‘forma‘”, escreveu Scorsese. Segundo ele, gradualmente a palavra começou a ser cada vez mais usada como um “termo comercial para todas as imagens em movimento”, seja em relação ao seu filme “O Irlandês”, seja para qualquer um dos milhões de programas de TV, longas-metragens, curtas-metragens ou documentários que aparecem nessas plataformas. Para o cineasta, “conteúdo” tanto pode referir “um filme de David Lean, um vídeo de gatos, um anúncio do Super Bowl, uma sequela de um filme super-heróis, ou um episódio de uma série”, perdendo-se na quantidade infinita de “conteúdos” que essas plataformas possuem, o trabalho de grandes mestres.

No mesmo ensaio, Scorsese reconhece que a ascensão de streamers como Netflix e Apple TV+ permitiram que ele e outros cineastas tivessem novas oportunidades para fazer filmes, mas mostra-se preocupado com o confiar num algoritmo na apresentação de escolhas direcionadas para um espectador. Algumas exceções que Scorsese aponta são serviços de streaming com curadoria, como a MUBI e o Criterion Channel, já que apresentam sugestões de filmes aos seus utilizadores a partir de uma seleção prévia, de um trabalho de curadoria. “A curadoria não é antidemocrática ou ‘elitista’, um termo que agora é usado com tanta frequência que se tornou sem sentido. É um ato de generosidade – você está partilhando o que ama e o que o inspirou.

“Não podemos depender da indústria do cinema, tal como está, para tomar conta do cinema. No ramo do cinema, que hoje é o do entretenimento visual de massas, a ênfase está sempre na palavra ‘negócio’, e o valor é sempre determinado pela quantidade de dinheiro que se ganha com um determinado produto (…) Nesse sentido, tudo, de ‘Sunrise‘ a ‘La Strada‘ a ‘2001‘ agora está praticamente seco e pronto para o rótulo de filme de arte numa plataforma de streaming. Temos que deixar bem claro para os atuais proprietários legais desses filmes que eles representam muito, muito mais do que serem uma mera propriedade a ser explorada e, em seguida, trancada. Eles estão entre os maiores tesouros de nossa cultura e devem ser tratados como tal”, conclui o realizador.

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