Sábado, 11 Maio

Maria Abreu e Tónan Quito: as Alegrias e Tristezas dos atores do novo filme de Tiago Guedes

Maria Abreu e Tónan Quito falaram ao c7nema sobre a experiência de transpor o teatro em tela e as peripécias da gravação de Tristeza e Alegria na Vida das Girafas

 

Os protagonistas do novo filme de Tiago Guedes, realizador do também lançado este ano A Herdade, Maria Abreu e Tónan Quito, falaram ao c7nema sobre o processo de adaptação cinematográfica da linguagem teatral, além das adaptações pessoais no processo profissional.

A primeira experiência de Maria Abreu em frente às câmaras, a primeira vez a trabalhar com o pai, o realizador de Tristeza e Alegria na Vida das Girafas, em ambiente profissional, e como foi ouvir tantos palavrões do urso Judy Garland, interpretado pelo ator e já amigo de família, Tónan Quito: tudo pode ser descoberto na conversa abaixo.

Tónan Quito, já tinha dito tantos palavrões, tantas vezes seguidas?

(risos) Não. Pelo menos tantos e durante tanto tempo e tantos dias, não.

Como foi falá-los à Maria, já que já se conheciam?

Foi normal. Quer dizer, a questão é a intenção com a qual os palavrões saem. O Judy Garland é um urso muito revoltado, sozinho e deprimido, e usa os palavrões porque são as únicas palavras que lhe servem para dizer o que sente e o que pensa. Nesse caso, com a Maria, no início, foi um pouco estranho, uma situação ou outra em que dizíamos: “ê lá, tanta agressividade para quê? Não é preciso” (risos). Mas isso foi mesmo ao início.

Conheci a Maria e já tinha trabalhado com ela, convidado-a para entrar num espetáculo do Ricardo III. Nunca tínhamos propriamente trabalhado e uma coisa é a gente ler e dizer aqueles palavrões assim a rir-se e não sei o quê, outra coisa é quando começamos mesmo a fazer aquilo que tem que ser feito, e aí é sempre estranho estar sempre tão agressivo com uma criança. Mas é só trabalho e a coisa andou.

O Judy Garland é uma espécie de alter-ego da Girafa, como vocês trabalharam juntos para criar a relação que vemos no filme?

Tónan: Acho que não houve nada que tivemos de fazer para se trabalhar nisso. Foi espontâneo e o texto já tinha isso. No texto do Tiago Rodrigues, na peça estreada em 2011, eu já tinha trabalhado. Portanto, aqui era só ter uma criança à minha frente, mas como tenho uma relação afetuosa com a Maria não havia esse problema, era mais um “deixa estar, não se preocupe que eu digo essas coisas todas que está a pensar”. Mas quero dizer, nunca cheguei a pensar nisso.

Maria: Sim! (risos) Eu também não, nunca pensei em fazer alguma coisa, foi sempre muito espontâneo.

Como foi passar isso do teatro para o cinema, Quito?

O texto é exatamente o mesmo. Se calhar, não fizemos uma cena ou outra, mas acredito que não. Acho que fizemos tudo. A montagem depois é que acaba por ser diferente do que era a peça. Na peça, não era uma criança que fazia, era uma atriz da minha idade. O Pedro Gil fazia as outras quatro personagens, o Miguel Borges já fazia o pai e o Tchekov, e eu fazia o Judy Garland.

Basicamente, são coisas até técnicas, que é não ser tão explosivo como era no teatro, não tinha tanta liberdade, tinha que me condicionar ao plano da câmara e ser um bocadinho mais conciso, preciso e aguentar a energia durante horas para fazer um só take. No teatro, quando começamos, vamos do princípio ao fim. Andámos ali três semanas a fazer aquilo que fazemos em duas horas.

A maior dificuldade foi fazer essa gestão de energia e daquilo que se tem de fazer. Começamos a nos repetir muito e às vezes começa a ficar gasto, ou às vezes só se descobre no final. Como já tinha feito a personagem, conhecia bem o que ela ia fazer em cada momento, com pequeninas alterações e adaptações à Maria. Mas não ensaiamos, foi chegar lá e: “bora lá ver se isto funciona“.

Maria, esta é a sua primeira longa-metragem. Como foi isso?

Maria: Sim, foi a minha primeira. E ainda por cima com a melhor equipa. Foi a única que tive até agora, mas acho que nunca vou ter uma equipa igual a esta. Tinha o apoio de todos os lados: dos atores, das pessoas que estavam atrás das câmaras. As pessoas que não conhecia tornaram-se mesmo muito importantes e neste momento são pessoas que me marcaram para o resto da vida.

Tónan: O trabalho que a Maria teve em três semanas ou quatro, aquilo que eu já sabia do texto, foi só pegar numa semana. A Maria esteve ali a preparar-se muito, muito antes. Aquilo era de manhã, à tarde, era muito para uma menina de 11 anos, não é? Ao final do dia era um pouco cansativo, todos a aguentarmo-nos uns aos outros. A Maria, principalmente, estava cansada e cheia de calor. Cada um com o seu motivo, mas é isso mesmo que ela está a dizer. Por causa da equipa, conseguimos aguentar muito bem.

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Como foi ter o seu pai como realizador e gerir a relação familiar e profissional, Maria?

Quando o meu pai disse-me que eu iria fazer o filme, fizemos logo um acordo: “em casa sou pai, a filmar sou realizador. Ou seja, tudo que eu te disser não leves como se eu fosse o teu pai, e não fiques ofendida porque estou a ser o realizador. Estou a dizer o que a atriz precisa naquele momento”.

Eu sempre reagi com um “ok, tá-se bem“, mas o meu pai nunca conseguiu completamente ser o realizador, sempre tinha o seu lado de pai. Levei tudo o que ele disse como um novo conhecimento e uma parte para eu melhorar todo o trabalho que estava a fazer. Portanto, acho que correu bem. Se fosse outra pessoa, acho que não ia correr tão bem como correu.

Gostaria de saber dos dois, o que mais gostaram de gravar?

Maria: Ui. Eu gostei muito de tudo.

Tónan: Sim, não me lembro assim bem… já foi há dois anos. Mas, se calhar, logo o primeiro dia, porque filmamos a cena da banheira e a cena da morte logo nesse dia. Foi a única coisa que invertemos. Depois gravamos quase tudo cronologicamente, como se passa na peça. Mas já tinhas começado antes, acho eu, Maria.

Maria : Sim! Foram as cenas que eu estava a fazer sozinha e tu não aparecias.

Tónan: Exato, foi mesmo isso. Gravamos no mesmo dia a morte e o início, e foi marcante.

De quem surgiu a ideia inicial de trabalhar como atriz, da Maria ou do seu pai?

Maria: Eu já pedia há muito tempo e meu pai dizia-me sempre que não ia acontecer, mas depois chegou o dia em que ele decidiu que ia acontecer. Do lado da minha mãe, como ela é atriz e o meu pai trabalha com atores, os amigos da minha mãe, tipo o Tónan e essas pessoas, nunca entendia por que é que eles gostavam de fazer aquilo que fazem.

Tónan: Nem eu. Não percebo (risos).

Maria: (risos): Eu estava sempre com muita curiosidade, do tipo: “porque é que a minha mãe gosta de fazer isto? Porque é que aquelas pessoas fazem aquilo?” Então, estava sempre a pedir para fazer quando tinha a oportunidade, e por mais que o meu pai me desse o sim como um não, eu continuava até o dia em que conseguia. E esse foi dos dias mais felizes de sempre.

E agora pretendem fazer o quê?

Maria: Não sei, pretendo continuar, mas continuar com algo que seja bom, mesmo. Que seja divertido de fazer, tenha um bom conteúdo e que dê para tudo.

Tónan: Neste momento, estou a fazer os ensaios numa peça do Gonçalo Waddington que vai estrear no Teatro Nacional Dona Maria II. Depois vou ter um espetáculo meu, que estou a preparar, em julho do próximo ano, no Teatro São Luis e no Teatro Nacional Dona Maria. Depois, em setembro, [o espétáculo] irá ao Porto, no Rivoli e no Teatro Nacional São João.

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