Sábado, 18 Maio

El Vientre del Mar: “Tem de haver limites para o capitalismo selvagem”

"El Ventre del Mar" é exibido na sessão de encerramento do Cinefiesta, neste domingo (28/11). O C7nema foi ao cinema São Jorge conversar com Óscar Lapoya, um dos protagonistas.

O veterano Agustí Villaronga resolveu filmar perto de casa durante a pandemia. Inicialmente pensada para o teatro, a adaptação do texto de Alessandro Baricco foi parar aos ecrãs por causa do confinamento. E, como conta Óscar Kapoya, aproveitando aquilo que havia por todo lado numa vivenda nas Ilhas Baleares: mar.

O filme recria um naufrágio ocorrido em 1816 que se tornou uma das maiores humilhações da história marítima francesa. Depois de metade dos passageiros, sem botes, ter sido deixada para trás numa “embarcação” ao sabor das águas, sucederam-se suicídios, assassinatos e canibalismo na luta pela sobrevivência.

No drama criado por Villaronga, esta história é reconstruída por dois personagens – o do oficial Savigny (Roger Casamayor) e do marinheiro Thomas. E é aí que entra Óscar Kapoya – encarnando a voz dos oprimidos e a força emocional que contrasta com a frieza do militar francês.

A entrada no projeto, o primeiro filme importante de um ator com uma sólida carreira no teatro na sua cidade natal, Barcelona, veio justamente deste universo. “O Agustín já me conhecia há muito tempo, já me tinha visto trabalhar em teatro”, conta. “No final de 2019, chamou-me para uma peça de teatro. Mas passados alguns dias disse-me que não seria possível porque havia um requisito de que os atores fossem das Ilhas Baleares” – a produção era de lá. “Mas no confinamento chamou-me e disse que tinha um projeto”.

O projeto foi filmado numa fábrica. Conforme relata, “foi uma rodagem dura, pois estávamos sempre molhados. Apesar de ser verão foi desconfortável, pois estávamos sempre a ser molhados e a precisar de água quente. Já mar foram dois dias, foram melhores do que o esperado, não houve problemas para rodar”.

OS LIMITES PARA O CAPITALISMO SELVAGEM

Filmado em preto-e-branco, com imagens que muitas vezes parecem quadros e noutras tornam-se quase abstratas, “El Vientre del Mar” também traz uma série de questões sociais e raciais que o interligam de forma óbvia ao drama das travessias dos imigrantes no Mediterrâneo. E é para esta questão que ruma a conversa.

https://phantom-elmundo.unidadeditorial.es/d6a2a579334ff6811467992a5689ecd8/resize/746/f/webp/assets/multimedia/imagenes/2021/06/12/16235332567772.jpg
Kapoya em “El Vientre del Mar”

Estas pessoas devem estar muito desesperadas para pagar mil, dois mil euros, por uma viagem na qual nem sabem se vão sobreviver. As máfias aproveitam-se e os governos não intervêm para ajudar. Tudo isso é uma consequência do capitalismo voraz”, acredita.

Dentro desta ideia, os países ricos beneficiam das matérias-primas que exploram nestes países, e os lucros não se revertem para a população. E mudar o estado de coisas não é tarefa fácil… “Os governantes destes países [africanos] pertencem a poucas famílias, muito ricas e poderosas, e não há interesse em direitos humanos ou laborais. Os membros desta elite estão em contacto, são amigos, das elites europeias e, se quisessem trabalhar em prol de maior justiça social, enfrentariam problemas”.

Para Óscar Kapoya, teria de haver um limite para o capitalismo. “Há um limite para quão baixo pode chegar um ser humano – a condição de sem-abrigo. Mas para os ricos não existem estes limites, podem fazer tudo. É claro que isso gera danos colaterais e a imigração é um deles”, conclui.

O ator, apesar da marcante presença num dos melhores filmes deste Cinefiesta e que já coleciona alguns prémios no meio internacional (especialmente no Festival de Málaga), deve voltar ao seu “habitat” natural, o teatro. Com base num texto da dramaturga inglesa negra debbie tucker green, Lapoya volta a ter um personagem forte – novamente envolto em dilemas raciais. 

Notícias