Sábado, 18 Maio

«Jessica Forever» por André Gonçalves

Nesta era global de informação, sabíamos já que esta primeira longa-metragem de Caroline Poggi e Jonathan Vigel – que têm toda a sua obra integral em curtas-metragens como foco nesta edição do IndieLisboa – seria de partir vidros, de amar ou odiar. Não se pensava porém que este sentimento de amor-ódio pudesse estar contido num mesmo espectador… 

A dupla de cineastas propõe aqui uma distopia metafórica que vai, minuto sim, minuto não, desafiando as nossas convenções tradicionais sobre o que possa ser ridículo ou o que possa até ser brilhante por propôr um novo paradigma, não tendo quaisquer complexos de mergulhar fundo em territórios que poucos cineastas não ousariam, mesmo à primeira longa-metragem (ou sobretudo?). 

O filme começa até como todas as distopias começam, com uma breve contextualização do que se passa neste mundo, embora os seus créditos iniciais numa tipografia “feia”, de videojogo RPG, ou de objeto manhoso no canal “SciFi”, deixem desde logo antever a disrupção que se seguirá. O nosso planeta é povoado por “orfãos”, pessoas perdidas que são alvo militar de extinção. Uma jovem, Jessica, acolhe-os e protege-os, algures entre um Cristo no feminino e Joana D’Arc. (Pode-se imaginar já um babanço “queer” sobre esta questão). Estes orfãos, sob a sua alçada, formam então uma irmandade militar de rebeldes, que se tentam fixar, de uma forma algo assexual, embora o romance acabe por surgir eventualmente num deles…  

Usando efeitos visuais propositadamente “kitsch, e não se importando até em resgatar mortos com esses mesmos efeitos (Portugal tinha um programa chamado “Ponto de Encontro”, e uma cena está nessa linha, agora no além), ou retirar palavras de um bolo de aniversário, em quebrar cenas e parar abruptamente a banda sonora, em usar uma lógica de videojogo até como mecanismo que consiga ligar este grupo de pessoas, este é um filme disposto a atirar em sistemas convencionais de crítica e lógicas de “estrelinhas”. Pensando que todos os movimentos novos artísticos passaram por uma reação de escárnio semelhante ao que possamos ter com esta obra, o que fazer? Passadas umas horas sobre o seu visionamento, a dúvida permanece: lixo ou obra-prima? Ficaremos pelo meio termo, porque a resposta está claramente ainda encriptada a quente. Algo é certo: não nos esqueceremos tão facilmente desta experiência, ao invés de outras que se ficam pela linha de água…


André Gonçalves

 

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