Sábado, 18 Maio

«CQ» por Nuno Centeio

 
 

Sinopse

O ano é 1969, o ano do festival de Woodskock, Easy River e Midnight Cowboy. O local é Paris, ainda a refazer-se da reforma estudantil de 1968. Paul (Jeremy Davies) é um jovem aspirante a realizador, que vive e trabalha em Paris. Passa o tempo na sala de montagem, fazendo filmes de ficção científica, mas a sua grande paixão é um determinado e idealista retrato verité da sua vida quotidiana. Paul considera que o filme deve ser honesto, algo que a sua namorada Marlene (Elodie Bouchez) não consegue entender, já que considera que o namorado gosta mais da câmara do que dela.
 
Paul trabalha como editor em Dragonfly, um filme futurista passado no ano de 2001, com Valentine (Angela Linvall) ne pele de bela heroína e Billy Zane como o sexy Mr. E. O louco autor do filme, Andrzej (Gerard Depardieu) é também o realizador e o produtor, Enzo (Giancarlo Giannini) ordena-lhe que se retire do filme quando este começa a ficar obcecado. Contratam então Felix de Marco (Jason Schwartzman) para assumir o controlo do filme. Paul sente inveja dele mas quando este tem um acidente de automóvel Paul assume a direcção do filme. Quando se depara com esta grande oportunidade e responsabilidade, vê-se cada vez mais envolvido no filme e a ténue linha entre vida real e ficção vai desaparecendo. Paul cresce então a nível artístico e profissional. É 1970, o início de uma nova década… para Paul, a altura certa chegou… 

Elenco

Jeremy Davies, Angela Lindvall, Elodie Bouchez, Gerard Depardieu, Massimo Ghini 

Realizado por Roman Copola

Crítica

O ano é o mágico 1969. Nos Estados Unidos é tempo de Woodstock, da primeira caminhada na Lua, dos assassínios de Charles Manson, e dos protestos contra a guerra do Vietnam. A nível artístico vive-se uma época efervescente, e o cinema não é excepção.
 
Na Europa, enquanto uns se dedicavam a produzir filmes kitsch baseados em banda desenhada de gosto duvidoso (como “Barbarella” ou “Danger:Diabolik”), no outro extremo um tal de Godard ou um Antonioni exploravam o filme artístico, pessoal, o cinema verité e “de auteur”. “CQ” (sigla usada na comunicação morse e que provém do inglês, “seek you”) transporta-nos para Paris onde Paul, um jovem cineasta americano (o promissor actor Jeremy Davies), trabalha na montagem de um desses filmes de grande produção, um delírio futurista passado em 2001 com o nome “Codename: Dragonfly”. Embora Paul não se reveja no filme, precisa dele para poder usar o equipamento nas horas livres, em casa, e filmar o seu próprio filme de autor, um verdadeiro diário da sua vida a preto e branco, onde o pormenor de um sabonete usado pela namorada é interessante porque a imagem emana o seu cheiro.
 
O realizador de “Dragonfly” (Gérard Dépardieu) não consegue terminar o seu filme porque está obcecado pela actriz principal, Valentine (a deslumbrante modelo Angela Lindvall). É então que um novo realizador famoso é chamado para terminar a produção (Jason Schwartzman), mas as suas atitudes exibicionistas envolvem-no num acidente de viação, afastando-o também de “Dragonfly”. Sobra então aos produtores italianos (interpretados por Giancarlo Giannini e Massimo Ghini) o jovem americano, a quem é incumbida definitivamente a missão de terminar o filme.
 
Nesta película, quase uma ode ao cinema (não tão caótico como “Celil B. Demente”), temos então um filme dentro de outro, e mais um em curso paralelamente. Confuso? Não com a direcção de Roman Coppola. Segundo consta, o primogénito de Francis Ford Coppola juntou uma quantidade gigantesca de informação sobre os filmes kitsch (e não só) da época, de modo a que actores, direcção ar tís tica e cenários conseguissem entrar em perfeita simbiose com o rebuliço do final dos anos 60. Para isso Roman baseou-se em filmes como os que já citei, mas também “Davis Holzman’s Diary”, um filme de Jim McBride onde este conta a sua vida ao longo de uma semana, num registo típico do cinema verité, e que “CQ” transporta quase na íntegra. Durante o filme de Coppola, Paul também filma uma semana da sua vida e durante o processo acaba mesmo por perder a sua namorada, tal como na película de McBride.
 
“CQ” não é um objecto atípico. Não é a primeira vez que estamos face a um filme sobre filmes (“State AND Main” é um exemplo relativamente recente). Mas há que dar o devido valor à maneira como somos transportados para os sets de uma época onde várias das mais importantes correntes estilísticas do cinema germinaram. Ao longo do filme podemos assistir a um “confronto” entre duas filosofias tão em voga na crítica actual. O cinema pelo entretenimento, aqui a cair muitas vezes no ridículo (há uma cena de “Dragonfly” onde chega a nevar na Lua!), ou a sétima arte de autor, onde a mensagem a transmitir é algo mais do que um simples objecto lúdico.
 
Em suma, “CQ” não vai ficar no road-map dos grandes filmes, mas consegue ter tanta qualidade como “The Virgin Suicides”, da irmão mais nova Sofia Coppola (que também aparece brevemente no filme). 
 
Enquanto nesta última produção que revelou Kirsten Dunst éramos agraciados com uma fabulosa banda sonora dos franceses Air, em “CQ” os gauleses Mellow não lhes ficam atrás. E repare-se na restante lista de actores que ainda nem sequer mencionei: Billy Zane, Dean Stockwell e John Phillip Law.
Não se vão arrepender da visita às salas de cinema.
 
 
 Nuno Centeio
 

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