Sexta-feira, 3 Maio

Histórias de África que não se aprendem nas escolas…

Uma imagem encontrada pelo realizador Billy Woodberry – um dos fundadores do movimento L.A. Rebellion, um coletivo de cineastas Afro-Americanos por um cinema negro nos Estados Unidos – foi o ponto de partida para a curta-metragem A Story From África (Uma História de África) – em competição no Curtas Vila do Conde.

Nela, um grupo de negros acorrentado olhava com estranheza para uma câmara fotográfica. “Quando encontrei esta fotografia, pensei que era de outra altura… do tempo da escravatura?“, diz Woodberry, explicando depois que estamos afinal em 1907, em Angola, nos tempos de ocupação (denominada na época de “campanha de pacificação“) levada a cabo pelo exército Português sobre o povo Cuamato no sul de Angola, após as conferências de Berlim de 1884-85, onde se definiu a partilha dos territórios Africanos pelas potências coloniais Europeias.

Uma História em África dá vida ao arquivo fotográfico destinado a comprovar a conquista através da trágica história de Calipalula, o nobre Cuamato essencial ao desenrolar desta campanha de pacificação.

Globalmente, ninguém sabe muito sobre o caso português na divisão do território africano efetuada pelas potências europeias, pois a discussão sobre tema normalmente fala mais dos casos ligados aos britânicos, franceses e holandeses”, explicou Woodberry na apresentação do seu filme em Vila do Conde, uma coleção de fotografias contextualizadas com texto e uma banda-sonora assombrosa de António Sousa Dias que enquadram a participação e “pacificação” do sul de Angola por parte do Exército Imperial Português, que efetivamente procedeu à ocupação efectiva dos territórios conquistados em 1907 ao povo Cuamato.

A participação portuguesa não é tão conhecida globalmente” acrescenta Woodberry, que após ver a primeira fotografia no Museu de Resistência e Liberdade em Lisboa em 2015 começou a investigar sobre a história por trás da imagem, com a ajuda de Teresa Andrade e Rui Santos, da produtora Divina Comédia.

A chave da investigação foi o álbum fotográfico encontrado na Fundação Mário Soares, embora essa pista nos tivesse desviado do bom caminho, pois a pessoa que depositou o álbum na Fundação não era o fotógrafo» explicou o realizador, adiantando que durante muito tempo pensaram e foram seguindo pistas erradas sobre o “seu alvo”. “Eventualmente encontramos o nome correto do fotógrafo e encontramos uma cópia do seu trabalho nos EUA, tendo o Rui comprado através da Ebay.

Ocupação e submissão com o nome pomposo de “pacificação”

As nações sempre encontraram eufemismos para descrever as suas conquistas e ocupações territoriais. Neste caso, “pacificação” foi o nome oficial encontrado para uma história de submissão de um povo e de uma região que esteve em destaque anos mais tarde na 1ª Guerra Mundial quando soldados alemães invadiram a zona.

Woodberry não entra em grandes explicações sobre a razão orgânica para isso, mas dá um exemplo próximo aos EUA, nomeadamente nos termos usados pelo governo norte americano na sua campanha no Vietname, onde a palavra “pacificação” também foi usado: “É um hábito [das nações] contarem a história de forma a glorificarem-se, de darem ao povo algo entusiástico sobre a sua história, sobre os seus feitos. (…) Felizmente há arquivos e locais de estudo onde podemos investigar aquilo que não nos ensinam na escola. Para descobrirmos algo mais temos de ir além daquilo que nos contam e felizmente existem formas e meios para chegar a isso. (…) Nós somos responsáveis por nos educarmos a nós próprios e partilhar o que descobrimos com os outros.

Notícias