Sábado, 18 Maio

«Ave Rara» por Jorge Pereira

Ave Rara conquistou o prémio de melhor curta portuguesa em Vila do Conde

Em 1562, Pieter Bruegel, o Velho, pintou A Queda dos Anjos Rebeldes, trabalho inspirado pelo trabalho de Hieronymus Bosch e que assenta numa passagem do Livro do Apocalipse (12, 2-9) onde se referencia a eterna luta entre o bem e o mal na forma de uma guerra entre arcanjos e anjos caídos em desgraça.

Esse trabalho notável serviu de inspiração a Vasco Saltão para a sua estreia na realização, ele que já conta com vários trabalhos ligados ao cinema em obras de João Salaviza (Rafa; Cerro Negro), Carlos Conceição (Coelho Mau), Pedro Pinho (Fábrica do Nada) e Mariana Gaivão (Solo).

Entre o real e o onírico, o arrojado ou pretensioso, o ambíguo e o convicto (em estilo binário) acompanhamos por aqui a história de um caçador implacável (Gustavo Sumpta) que em mais uma matança generalizada de aves dá de caras com dois anjos, assassinando um deles.

A partir daqui o tom enigmático implanta-se numa aldeia alentejana transportada para uma atmosfera medieval lôbrego onde não faltam cúrias oscuros, fiéis submissos e todos preparados para mais uma confrontação do bem e do mal. E é esse imposto mistério contínuo – que a certo ponto se transforma em desconfiança e soa a indecisão – que inflaciona um trabalho de escassos diálogos que conquistou tantos fãs em Vila do Conde como detratores.

Mas ao menos valha-nos isso, a ambição de fazer algo com muito poucas probabilidades de gerar consensos.


Jorge Pereira

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