Sexta-feira, 10 Maio

«Dumbo» por Ilana Oliveira

 
Comparar o Dumbo de 2019 com seu cânone de 1941 seria errado, e mais do que isso, injusto com outros remakes. Disney bebe na própria fonte e recria uma história com 40 minutos e vários arcos a mais do que a média-metragem de apenas uma hora de duração na qual se inspira. Mas será isso mau?
 
Nos papéis centrais da nova trama conhecemos a família Ferrier, composta pelo pai e seus dois filhos, que vive e trabalha no circo dos Irmãos Medici. A partir disso desenvolve-se então uma nova história na qual as referências e releituras são mais importantes do que a própria memória e a reprodução de imagens conhecidas e originais. Ao contrário do seu cânone, o último não é um musical, mas faz belas jogadas para quem já conhece o belíssimo trabalho feito pela versão de 41, ou seja, sente-se aqui a presença do antigo por meio de diálogos do guião, ou referências visuais claras, nada subtis para conhecedores. 
 
Ao beber de sua própria fonte, mas a abrir espaço ao novo e às adaptações necessárias para aceitação social (não é muito responsável representar as alucinações coloridas de um elefante bêbado), a nova versão de Dumbo cria mais possibilidades dramáticas para as suas histórias – não que um bebé elefante separado da sua mãe já não seja dramático o suficiente. 
 
Entretanto, toda essa potência criada pela possibilidade de mais, também é um ponto forte a ser analisado nesta obra, já que é desperdiçada por um arco vilanesco arquetípico e baseado em clichés que impedem o antagonista de realmente se tornar uma ameaça mais do que infantil. Michael Keaton, no seu papel como o empresário (em uma visão extremista, o próprio Walt Disney do mal e a sua Disneylândia), não se esforça para desenvolvê-lo como alguém que realmente passa um sentido de perigo, e apenas transmite um egoísmo típico do ideal “disnesco” de reprovação de índole.
 
Dentro das crianças principais, Nico Parker, a filha mais velha Milly Farrier, é ausente de carisma e possui as mesmas expressões faciais mesmo frente à descoberta de um elefante que voa. Por outro lado, Finley Hobbins, o menino Joe, demonstra em seu pouco tempo de antena que tem mais potencial que a colega de cena. E Collin Farrel e Eva Green compõem ao lado de Danny deVito os grandes nomes usualmente chamados pela Disney para dar volumes às suas personagens essencialmente rasas.
 
 
A realização de Tim Burton (ou mais vale dizer a não-realização?) sofre com a poda recorrente das produções de cunho livre da Disney e das suas fórmulas pré-concebidas de “moral da história”. O público é dificilmente agraciado pelas suas assinaturas, como é possível reparar em poucos momentos específicos, como a maquilhagem de Dumbo enquanto palhaço ou as cenas realmente obscuras ao longo do enredo.
 
Por outro lado, a cinematografia  – por vezes esfumaçada e que brinca com a entrada de luzes e cores vibrantes- atribui uma atmosfera rica e interessante para a colocação nesse universo de máscaras e representações circenses.
 
Em suma, Dumbo sabe referenciar e inovar em relação à sua matéria-prima, ao mesmo tempo que peca pelas suas convencionalidades dignas da sua produtora.
 
Ilana Oliveira
 

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