Segunda-feira, 20 Maio

“Eden Lake” por José Pedro Lopes

‘Eden Lake’ é a prova de que o ‘survival horror’ é um género com mais vidas que um gato, e que sabe renovar-se de cada vez que parece desgastado. Cada vez mais, parece que os ingleses sabem muito bem o que fazem!

Um casal de apaixonados sai no seu “jeep” da grande cidade em direcção à Nova Inglaterra, um zona pacata e muito florestada do Reino Unido, para passar um fim-de-semana romântico. Steve leva Jenny a acampar na margem do Eden Lake, um lago idílico dentro de uma reserva natural. O seu plano é pedir a mão de Jenny em casamento.

Os problemas começam quando eles são abordados e importunados por um grupo de adolescentes, vários rapazes e uma rapariga, de uma vila próxima. Vestidos de tactel, com correntes de ouro, um rádio a tocar ‘trance’ e telemóveis de terceira geração, este grupo de jovens aterroriza os outros jovens da região e não hesita a importunar o casalinho.
Irritados, Steve e Jenny vão à vila, onde descobrem um interior miserável e violento: pais que batem nos filhos, filhos que passam o dia a bater uns nos outros e a destruir coisas.
Quando voltam à reserva natural, o ‘jeep’ de Steve é roubado pelos jovens rufias. Mas o que parece uma brincadeira parva, vai escalando cada vez mais para a violência.

‘Eden Lake’ é um filme de ‘survival horror’ muito bem conseguido: o estreante James Watkins dá-lhe um ritmo incansável e a sua temática torna todo o discurso perturbador e, derradeiramente, aflitivo.
Ao contrário de ‘The Descent’ (compatriota) ou ‘The Hills Have Eyes’, que também contam com terror no interior abandonado, ‘Eden Lake’ apresenta uma ameaça real e perturbadora. São adolescentes, alguns até mesmo crianças, os criminosos do filme. E o seu relacionamento é soberbamente recriado.,
O nível de eficácia é enorme. Não temos monstros em grutas, ou criaturas deformadas, mas sim um grupo de crianças aterrorizadas por um ‘bullie’, que as obriga a fazer todo o tipo de atrocidades. A certa altura do filme, os miúdos têm o herói Steve amarrado e o seu líder, Mark, obriga-os, à vez, a esfaquearem-no. Nenhum dos miúdos quer mas, pressionados, todos o fazem. É o ‘bullying’ levado ao extremo: à violência e ao homicídio.

James Watkins, argumentista e realizador, cria tudo muito bem. O retrato dos pais dos miúdos é brilhante. ‘Eden Lake’ não é um mero filme de sustos, é um retrato, realista e duro, de um interior esquecido e entregue a uma violência arcaica do ponto de vista de quem está habituado ao urbanismo civil de Londres. As crianças de ‘Eden Lake’ crescem num meio pequeno, machista, onde se bate nos filhos e onde não há real percepção dos limites do que é ou não ser um criminoso.
Pena é que ‘Eden Lake’ seja atraiçoado pelo seu duo protagonista: os heróis Steve e Jenny não têm carisma e tomam por vezes decisões nada realistas. Exemplo disto é quando Steve entra, desnecessariamente, dentro da casa de um dos miúdos apenas para haver mais uma cena de tensão. Ou o facto de nenhum dos heróis, nomeadamente Jenny, que é apresentada como professora, tentarem apelar à razão aos demais miúdos, que são pressionados pelo vilão Mark. O suspence de ‘Eden Lake’ não é magistral como o de ‘The Descent’, tem momentos muito bem conseguidos mas várias situações que são criadas e resolvidas com demasiada conveniência.

Kelly Reilly tem o seu charme no ecrã, que funciona bem no primeiro acto do filme, mas quando a acção azeda a sua interpretação vacila e torna-se, por vezes, aborrecida. E o protagonista Micahel Fassbender ainda pior. Um bom exemplo disto é uma sequência passada numa cabana sobre o lago, onde estão os dois escondidos, e ela tenta prestar-lhe primeiros socorros. O duo consegue cortar o ritmo do filme com uma cena tão mal actuada.

Mas estas falhas são compensadas por uns 10 minutos finais aterrorizadores, onde ‘Eden Lake’ é perspicaz e brilhante. É neste ponto que o filme entra num caminho nunca visto num filme deste género – um caminho bem perigoso e polémico. Mais não me atrevo a revelar mas é um momento verdadeiramente aterrorizador.

Não haja dúvida da vitalidade do género ‘Survival Horror’ no geral, pois gera ainda filmes tão mordazes e provocadores como este. E da cinematografia britânica, capaz do melhor humor, de vencer Óscares e de criar grande títulos no fantástico.

7/10

  José Pedro Lopes

 

 

 

 

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