O filme dinamarquês “As in Heaven“, dirigido por Thea Lindeburg, foi apresentado na competição oficial para a Concha de Ouro do Festival de Cinema de San Sebastian. E até à data, esta é a primeira estreia no programa principal.

Se considerarmos a tradução portuguesa da implicação religiosa no título “como no Céu” talvez possamos confirmar o que se passa logo desde os primeiros planos. Até porque parece concretizar a esperança da jovem Lise (Flora Ophelia Hofman Lindhal) poder ir para a escola, e não ver a sua vida dedicada ao trabalho naquela quinta dinamarquesa ainda antes do início do século XX. Do campo banhado de sol, com o trigo maduro prestes a ser ceifado, percebe-se essa proximidade com o paraíso. Só que o seu não é um paraíso na terra.

Logo após dois ou três minutos, uma inexplicável brutalidade dos elementos deixa antever uma tempestade de sangue. No fundo, perceber-se-á que se trata da tal luta entre os elementos do Bem e do Mal, sobretudo numa cultura religiosa tão arreigada na região.

Naturalmente, percebe-se que Thea Lindeburg terá presente na sua mente o clássico de 1955, “Ordet“/”A Palavra“, do também dinamarquês Carl Theodor Dreyer. Até pelo ponto de vista juvenil fornecido pela longa linhagem de raparigas da família, afinal de contas a futura força de trabalho da quinta. Quando a mãe tem uma nova gravidez, a esperança de a poder libertar do seu desígnio ilumina-se.

Referências à parte, sente-se que Lindeburg hesita em assumir um contorno de filme de terror, em redor do fanatismo, bem como das dúvidas religiosas, parecendo por vezes aproximar-se até mais de Michael Haneke. Seja como for, o filme parte da adaptação do romance clássico de 1912 da autora Marie Bregendahl, e das 24 horas que literalmente mudam o curso da vida de Lise. Entre os planos maravilhosos com que a menina de 14 anos acorda e a realidade do dia seguinte em que se tornará na referência principal de uma grande família.

O filme dura pouco menos de uma hora e meia, mas parece bem mais. Infelizmente, pela simplicidade de contornos, torna-se quase impossível ter empatia e simpatia pelos personagens, pois tudo é esquemático demais, mesmo que esse esquematismo não transforme as personagens em arquétipos.  

Pontuação Geral
Paulo Portugal
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