Segunda-feira, 6 Maio

Burhan Qurbani: “Welket Bunguê é uma força da natureza”

Membro do júri do Festival do Cairo, o cineasta alemão de origem afegã ‎Burhan Qurbani explicou ao C7nema como o ator, e também realizador, Welket Bunguê, nascido na Guiné-Bissau, mas há anos com carreira artística em Portugal, o conquistou para o protagonismo do seu “Berlin Alexanderplatz”, tornando-se atualmente “num grande amigo”.

Burhan Qurbani

Não escolhi o Welket, ele é que me escolheu. É uma força da natureza. Quando estávamos a fazer o casting, em 2017, na Berlinale havia um filme chamado “Joaquim”. A minha diretora de casting viu-o e disse-me: tens de ver este rapaz. Ele é incrível, bonito… A personagem do livro onde o filme se baseia é um homem de 40 anos, muito cru, rude, mas o Welket é uma das pessoas mais inteligentes que conheço. (…) Foi ele que  preencheu muito a personagem que interpreta [um imigrante]. O que faço normalmente com os meus atores é dar-lhes 3 a 5 páginas com o historial das personagens, implantando um trauma nelas. Eu trabalhei a sua personagen, o Francis, com ele. Falou-me muito da sua infância em Portugal, do seu pano de fundo que envolve a Guiné-Bissau, e como é crescer sendo um negro em terras lusas. O que é muito bom no Welket é que no seu trabalho ele faz a descolonização, de como a sociedade branca ainda vê o corpo negro”, explicou o cineasta que também deu nas vistas em 2014 com “Nós Somos Jovens. Nós Somos Fortes” (Disponível na Netflix).

Desenvolvido durante 8 anos, chegando mesmo a ser “atormentado nos sonhos por um Rainer Werner Fassbinder que o visitou”, Qurbani confessou-nos que logo após a estreia de “Berlin Alexanderplatz” no Festival de Berlim, no início de 2020, estava exausto e entrou em depressão, encontrando ajuda em Welket Bunguê. “Tornou-se um dos meus melhores amigos. Foi uma das pessoas que me arrastaram para fora da depressão. É quase 10 anos mais novo que eu, mas tem uma sabedoria e maturidade que ainda não tenho. Estou muito grato por ter alguém assim.

Crítica, pandemia e influências

Além da depressão que se abateu sobre o cineasta, a pandemia também afetou toda a carreira de festivais do filme, e a promoção ao mesmo por parte do realizador, que encontrou no Cairo um sopro refrescante para o mundo em que vivemos, particularmente na Europa.

Confessando não ser fã de Rainer Werner Fassbinder, Qurbani diz que cresceu a ver obras de mestres do cinema novo norte-americano, como Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Brian De Palma. “Eles são o meu DNA fílmico”.

Sobre as críticas ao filme, o cineasta não é indiferente, mostrando como é complicado lê-las quando um projeto demorou 8 anos a fazer e é avaliado alguns momentos após o visionamento de um filme. “Lixa-me completamente. Se trabalhas tanto tempo num projeto, como não podes levar as coisas pessoalmente? É algo que crias e alguém vê durante três horas, enquanto tu trabalhaste nele oito anos, e diz mal… Bem, é complicado. Mas cada vez reajo melhor às críticas. Quando fiz o meu primeiro filme era tão jovem. Pegaram no meu trabalho final e levaram para a competição [da Berlinale]. Não estava de todo preparado para lidar com aquilo. Hoje em dia “engulo sapos”, mas consigo aguentá-las [as críticas]. Mas claro, ainda me magoam.

Novo projeto, ao jeito Krzysztof Kieślowski

Tal como Krzysztof Kieślowski, Qurbani prepara uma trilogia de cores, com o preto, vermelho e dourado da bandeira alemã a transformarem-se em “Liberdade”, “Unidade” e “Justiça”.  “Estive deprimido um mês, parelizado durante a pandemia Covid-19, mas uma manhã acordei e comecei a escrever. Se Deus quiser [Inshallah] teremos dois guiões terminados no início do próximo ano, e talvez possamos começar as filmagens em 2022“.

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