Sábado, 18 Maio

Michel Franco: “Todas as revoluções a que assistimos falharam”

Verde é a cor da esperança, da ecologia, dos movimentos e ativismos, dizem por aí, mas no bombástico “Nuevo Orden” de Michel Franco, uma das cores da bandeira mexicana é utilizada como marca estética de uma revolta que dá para o torto e para medidas totalmente autoritárias.

“Primo” mexicano de “Parasitas”, como se o filme de Bong Joon-ho se encontrasse a meio caminho com “Os Filhos do Homem” de Alfonso Cuáron, “Nuevo Orden” não está longe ideologicamente de “Mano de Obra”, que Franco produziu no ano passado, e que seguia a ocupação de uma casa, numa espécie de regime socialista na organização, e como a transformação humana transita para o pior quando o poder começa a criar vícios.

Todas as revoluções a que assistimos falharam. A revolução mexicana foi há cem anos e o país está num estado terrível”, explicou-nos o cineasta em San Sebastián, onde o filme passou depois de estreia – e prémio – em Veneza.

Michel Franco em Veneza

Agora no Festival do Cairo, local que há uns anos assistiu ao florescer da Primavera Árabe na célebre Praça Tahrir, o filme de Franco gera comoção e reflexão sobre o estado das coisas. “Peguemos na revolução cubana, feita para melhorar a vida das pessoas. Primeiro, foi muito sangrenta e isso foi logo doloroso. Acho que a maior parte das ‘Novas Ordens’ nunca melhoram muito as coisas“.

Começado a ser idealizado há seis anos, com o guião escrito há três e as filmagens há ano e meio, Franco diz que a realidade da sua distopia cada vez está mais próxima, como se vê pelos protestos recentes dos Coletes Amarelos em França, ou Hong Kong e Chile, não esquecendo o crescimento dos fascismos um pouco por todo o lado.

É como a pandemia. Estamos a aprender alguma coisa? O mundo será melhor e mais justo depois disto? Isto é uma espécie de revolução. Se falares com octogenários muitos vão dizer que nunca viram nada assim. Mas as coisas não vão melhorar. Os ricos vão continuar a ser privilegiados, e os pobres vão continuar a adoecer. Sim, alguns países conseguem atenuar essa diferença, mas poucos”.

Considerando-se ele mesmo um privilegiado, Franco afasta o cenário de cinismo no seu filme, falando antes em “objetividade” e num passo importante para “abordar estes problemas”. “Se não tivermos empatia com os mais frágeis, tudo vai explodir. Estamos sentados sobre uma bomba relógio e ninguém vê isso. Tudo o que não vemos acabará por nos matar. (…) Repare nisto. As pessoas nos protestos Black Lives Matter tiveram de fazer todas aquelas demonstrações, 60 anos depois da morte de Martin Luther King, apenas para provar que os afroamericanos devem ser tratados igualitaraimente em relação aos brancos! Por amor de Deus, em 2020 ainda andamos nisto”.

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