As peças de construção mais famosas do Mundo (e após 60 anos de existência continuam como um dos produtos de entretenimento mais vendidos globalmente), Lego, têm a sua aparição cinematográfica. Há um ano atrás, a notícia sobre a produção deste filme fazia temer o pior: uma Hollywood oportunista e sem criatividade e termos de produto. Bem, é melhor não falar desses pensamentos (basta revisitar outras linhas de brinquedos convertidas a filmes como Transformers e Batalha Naval para ter uma noção do “terror”). Contudo, após a visualização desta obra pode-se conferir que O Filme Lego é um “craque” entre os filmes baseados em brinquedos, talvez o melhor produzido até à data, uma panóplia colorida de humor simples, por vezes astuto e outras vezes através de gags físicos tecnicamente eficazes. É um entretenimento aconselhável para todas as idades, e nesse aspeto a nova obra de Phil Lord e Christopher Miller (a mesma dupla de Gru, O Maldisposto) é um trunfo.
Mas o que mais me surpreendeu não foi a versatilidade do filme para as audiências, mas sim a sua auto-crítica, a forma como satiriza o seu próprio produto. O Filme Lego é assim um epigrama sobre o estereótipo e a homogeneização social e quotidiana, focando na manipulação dos Media até à implementação de um “correto” estilo de vida (que filmes e músicas temos que obrigatoriamente gostar para sermos aceites na sociedade). Em termos mais metafóricos, o filme toca na falta de personalidade e senso livre que se vive em diversas cidades e outras comunidades cosmopolitas. E nada melhor que representar esses “venenos” sociais através dos bonecos Lego, figuras amareladas, replicadas, e fáceis de disfarçar pelos estereótipos sociais, étnicos, religiosos e profissionais. Obviamente toda esta mensagem, que é fortemente acentuada no início com uma sociedade fiel ao seu livro de instruções, é ligeiramente encaixada no subliminar da intriga e despida de qualquer acidez. Não existe aqui qualquer sinal de Tyler Durden e das suas anárquicas iniciativas.
Em suma: um misto de animação (não recomendado a epiléticos) com a ação real (a inserção destas sequências foi como uma espécie de cereja no topo do bolo em termos narrativos) que nos encoraja para o divertimento, para as referências e nalguns casos para despertar a criança em nós. O Filme Lego é assim uma proposta sedutora do cinema familiar e definitivamente a melhor interação entre uma linha de brinquedo e a Sétima Arte.
Hugo Gomes