Terça-feira, 7 Maio

Morreu Nelly Kaplan, figura da Nouvelle Vague e “pantera solitária”

Faleceu aos 89 anos a realizadora Nelly Kaplan, responsável por obras como “A Noiva do Pirata” (1969), “A Filha do Milionário” (1971) e “Charles e Lucie” (1979). Segundo o Le Monde, a cineasta morreu na manhã de quinta-feira de Covid-19 num hospital de Genebra.

Nascida em Buenos Aires, Argentina, e oriunda de uma família de judeus russos, Kaplan foi figura da Nouvelle Vague e foi conhecida igualmente pelas suas posições anarco-feministas, embora não fosse partidária de qualquer grupo.”Não gosto de movimentos! Sou uma pantera solitária. Não gosto de pessoas a dizerem-me para assinar coisas. Gosto de viver num ramo na selva. Feminismo não me interessa. Não sou misógina, mas no feminismo há ódio aos homens e não posso aceitar isso. Existem idiotas, mas bons homens também. Se as pessoas são boas, gosto delas; se não, não. Eu sou uma bruxa. Eu sei disso..“, disse numa entrevista em 2018.

De acordo com um dos seus familiares, François Martinet, que a entrevistou para a Cahiers du Cinéma, Nelly Kaplan havia acompanhado o seu companheiro, Claude Makowski, a Genebra, onde morreu em agosto com a doença de Parkinson. Desde então, ela estava numa casa de repouso onde contraiu Covid-19, da qual morreu.

Habitué da Cinémathèque Française, e ex-estudante de economia, ela deixaria a sua marca no jornalismo, na ficção surrealista, na teoria e crítica de cinema e na produção de documentários. Kaplan estreou-se no cinema juntamente com o realizador Abel Gance, trabalhando nos filmes “Magirama” (1956) e “Austerlitz” (1960), o qual escreveu e foi assistente de realização. Neste último filme, teve problemas com a atriz Martine Carol, apelidando-a mesmo numa entrevista de “cabra, maldosa e invejosa“: “Ela tentou humilhar-me, mandou-me ir buscar o seu café. Eu não dei a mínima; havia trabalho a fazer e eu conduzia a minha própria vida. Entre a meia-noite e as 6:00 da manhã, fiz o que queria.

Depois de assinar uma série de curtas-metragens, algumas delas documentais, ela lançou “A Noiva do Pirata” (1969) no Festival de Veneza. Nele, com todo o espírito pós maio de 1968, Bernadette Lafont é uma jovem que se vinga dos habitantes da sua localidade que a hostilizam. “Este filme será sempre moderno, contemporâneo; quando eu o mostro, as pessoas pensam que foi feito hoje.“.

Seguiram-se filmes a solo como “A Filha do Milionário” (1971), ou a meias com Claude Makovski, como ” É Preciso Viver Perigosamente” (1975).

A Noiva do Pirata

Fã de literatura, em particular de poesia, ela publicou em 1974, sob o pseudónimo de Bélen, o livro “Mémoires d’une liseuse de draps “, que viria a ser censurado. Um ano depois estreou nas salas “Néa” (1976), que fracassou, seguindo-se “Charles e Lucie” (1979).

Com inúmeros documentários assinados, sobre artistas como Gustave Moreau, Abel Gance, André Masson, Victor Hugo e Pablo Picasso, Kaplan viria a assinar o seu último filme em 1991: a comédia “Plaisir d’amour” (1991).

Sobre as mulheres nos seus filmes, a autora disse: “As mulheres nunca são passivas nos meus filmes … [elas] nunca são vítimas! Veja o final de “A Noiva do Pirata“: ela vinga-se de todos aqueles que a maltrataram. Não se deve aceitar um pontapé no traseiro – dá-se uma chapada ou chutamos de volta. Nunca aceitei ser arrastada na lama. Eu reajo como uma pantera!

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