Domingo, 19 Maio

Simon Rex: “Nunca ninguém acreditou em mim e deu-me uma oportunidade como o Sean Baker”

Aos 47 anos, Simon Rex conseguiu finalmente a consagração como ator, profissão que foi assumindo sempre no pano de fundo de muitas outras atividades que desempenhou. Da pornografia a modelo, passando por VJ da MTV, ator das comédias “Scary Movie”, Rapper e estrela do Vine, Simon Rex foi “sobrevivendo” na indústria do entretenimento, ganhando um novo alento quando Sean Baker o chamou para o seu “Red Rocket”.

O filme, pelo qual Simon Rex ganhou o prémio de melhor ator nos Independent Spirit Awards, segue Mikey Saber, uma ex-estrela do cinema pornográfico que regressa à sua pequena cidade natal, no Texas, onde ninguém realmente sentiu a sua falta ou ficou feliz pelo seu retorno. A começar pela ex-mulher, que o recebe em casa, e a sogra. 

Do imigrante chinês ilegal que tenta pagar uma dívida em “Take Out”, à atriz de cinema porno que faz amizade com uma idosa em “Starlet”, passando pelas transexuais de “Tangerine” ou pelo vendedor de material contrafeito nas ruas de Nova Iorque de “Prince of Broadway”, as personagens dos filmes de Sean Baker estão constantemente, e de alguma forma, nas margens da sociedade e são membros de minorias sociais mal interpretadas, frequentemente estereotipadas, ou sub-representadas. O Mikey de “Red Rocket” encaixa aqui na perfeição.

Red Rocket

O guião já tinha todos os detalhes sobre o que a minha personagem tinha de mostrar, o que me facilitou imenso a vida.”, explicou-nos Simon Rex em San Sebastián. “O Sean investigou durante muitos anos o tipo de personagem que representou, alguém que vem da indústria pornográfica. É um arquétipo de muita gente, atores e outras pessoas do mundo do entretenimento, que conheço em Hollywood, pessoas narcisistas sem qualquer noção do que as rodeia e quem magoam. Apanhei os tiques da personagem rapidamente, pois conheço muita gente assim. A grande dificuldade era tornar este homem alguém que as pessoas podiam gostar, ter empatia com ele e acompanhá-lo até ao fim do filme. Se a personagem for apenas um idiota, as pessoas desinteressam-se  e não querem saber do seu destino. Na verdade, não discutimos muito a minha atuação. Fiz a personagem e como ele não corrigiu, assumi que fiz o que ele queria. Foi tudo muito orgânico e muita gente questiona como consegue torcer por esta personagem, que na verdade é como as de Hollywood que citei. Ele não tem noção do que faz. Para ele é só uma forma de sobrevivência”. 

Sean Baker, que estava sentado ao lado do ator quando falámos com ele, também explicou como se processou a sua colaboração com Simon para conseguir trazer uma verdadeira genuinidade à personagem. “Encorajo sempre os atores a expandir a personagem além do papel. Veja por exemplo aqueles raps que o Mike canta. Sim, estavam escritos, mas havia também o trabalho de improvisação do Simon aqui e ali. E a cena de sabotagem no  fim tem muita improvisação. Os instintos do Simon estavam bem desde o início. Logo no primeiro dia de ensaios, vi a sua gravação e soube que era ele. Já o imaginava, por seguir a sua carreira há muitos anos que ele iria agarrar a personagem. Nessa tarde, na interação com a Bree Elrod, soube que era ele”.

Rex e Baker nas filmagens

O grande desafio

Segundo Simon, o maior desafio que o filme lhe trazia era o de dar credibilidade e dramatismo aos eventos da vida de Mike: “Cheguei aos momentos de comédia com alguma facilidade. É fácil para mim esconder-me atrás de piadas, pois já o faço na vida real e por isso posso dizer que a comédia em mim surge instintivamente. A atuação dramática foi o mais desafiante, o não ser “tonto” a toda a hora. Especialmente na criação do triângulo amoroso em que a minha personagem estava envolvida. Ele tinha de ser credível. Felizmente para mim estava rodeado de boas atuações e atrizes, o que facilitou-me muito.  A câmara capta tudo. Se eu fizer porcaria, as pessoas sabem. Vi alguns trabalhos meus do passado e não acredito nas minhas personagens, mas nesta sim. O Sean arriscou ao escolher-me, por isso também tinha de corresponder a essa oportunidade. Há 10 anos não conseguiria encarnar assim uma personagem. Foi preciso a experiência de vida e ganhar confiança para o fazer um papel como este

Será este um “Comeback”? E como será o futuro?

A imprensa norte-americana aborda muito a presença de Simon Rex no filme como um “Comeback”, um retorno (de onde?), e que com esta prestação Rex pode finalmente ser definido como ator. Cauteloso para com o futuro, Rex explica-nos como vê a sua participação e sucesso no filme de Sean Baker. A única coisa que tem mesmo a certeza é que  nunca ninguém acreditou e deu-lhe uma oportunidade como o realizador: “Não consigo  prever o que vai acontecer, se realmente vou seguir uma nova rota para a minha carreira. Vamos ver como é recebido nos EUA. Gosto de pensar que o filme vai trazer-me mais oportunidades e trabalho. Mas chamar um regresso (comeback), tecnicamente isso implicava que este filme e personagem realmente triunfaram. Tenho tido alguns sucessos aqui e ali, mas não participava num filme deste nível e grandeza há muito, muito tempo. A minha relação com a minha carreira estava entre estados. Fiquei perto de Los Angeles, caso me chamasse de volta, mas simultaneamente longe caso tivesse de seguir outra rota. O Sean chamou-me numa altura em que não esperava nada disso. Talvez possamos chamar de comeback, mas depende também das pessoas que estão familiarizadas com a minha carreira ou não. É um filme com muita comédia, mas também drama que exigiu muito do físico e do coração, algo que nunca tinha tido uma oportunidade de fazer. Sempre acreditei nas minhas capacidades, mas nunca ninguém acreditou e deu-me uma oportunidade como o Sean. Espero que outros cineastas vejam o filme e deem-me uma chance.

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